O grande galardão

O próprio Cristo, estabelecido no coração, é a recompensa grandiosa daquele que crê.

Henry Law (1707-1884)

“Eu sou o teu escudo, e o teu galardão será grandíssimo” (Gên. 15:1)

É uma grande verdade que o bem-estar e a paz habitam continuamente juntos no coração do crente. E tem que ser assim, porque onde há fé ali está Cristo, e ele é o autor e doador de todo gozo.

Separe, leitor, uns momentos, e medite nas singelas palavras que tratam de confirmar este princípio. Se o Espírito revelador de Cristo abrir o véu, poderás ver o próprio manancial da felicidade. E ao beber desta corrente pura poderá continuar o teu caminho com a perspectiva do próprio céu diante de ti.

Voz que sacode

Vamos agora aos inspiradores registros de Abraão. Achando-se este em seu país natal, em seu lar, e rodeado dos seus amigos íntimos, ouviu uma voz que lhe sacudiu da sua letargia: “Sai da tua terra e da tua parentela, e da casa de teu pai”. Muitos teriam dito que aquilo era muito duro. Mas o escolhido de Deus não. Por fé “obedeceu... e saiu sem saber para onde ia”. Não perdeu nada. Abraão recebeu muito mais neste tempo presente, e a vida eterna no mundo vindouro.

Depois de ter derrotado a vários reis para resgatar a Ló, Abraão teve ricos tesouros ao seu alcance. “Toma para ti os bens”, foi a tentadora oferta; mas com santa indiferença os desprezou. E não perdeu nada, porque depois receberia uma certeza mais rica que todos os tesouros da terra: “Não temas, Abrão; eu sou o teu escudo, e teu galardão será grandíssimo”.

Este relato nos vem de um mestre infalível, e nos ensina que o verdadeiro cristão é chamado a renunciar a muitas coisas, a ser abnegado e a espezinhar constantemente as cevas douradas deste mundo. Mas também nos ensina que toda renuncia é riqueza, e toda perda é ganho. Aquele que deixa tudo por causa de Cristo recebe muito mais nele.

Despojar-se para receber

Uns poucos exemplos bastarão para afirmar esta verdade. Há uma inscrição sobre a entrada da senda que conduz ao céu que diz: “Estreita é a porta e estreito o caminho”.

Portanto, aquele que deseja entrar deve despojar-se das roupagens pomposas que os homens ostentam nas amplas avenidas terrestres. Terá que arrancar toda auto justificação, porque isto é o que realmente enfraquece a alma. A confiança em méritos imaginários se adere a nós como a própria pele. Mas temos que renunciar a tudo.

As formas mais queridas de nossa própria personalidade devem ser desprezadas e tidas como algo abominável. Nossas qualidades mais apreciadas, nossas presunções prediletas e as causas de nossa superioridade devem ser rejeitadas como um trapo sujo. É muito duro retirar todas estas coisas e ir nu a Jesus para que ele nos vista, mas se de algum modo queremos ser salvos, temos que fazê-lo.

Deve-se, também, espalhar e atirar ao vento toda esperança que coloque a tua salvação nos ritos e cultos externos, ou nos símbolos da graça. Os canais da graça não são a própria graça. Os meios não são o fim. A porta não é a mansão. É este um ato que requer algo mais que o mero discernimento humano.

Satanás é muito hábil para cobrir nossas boas obras, e inclusive nossos lugares santos, com uma capa de eficiência salvadora. Esse ser maligno insinua, também, que se não crermos em todas essas coisas retiramos o seu valor para a religião. Mas não duvidemos: se não confiarmos em um Cristo único e sem acréscimos, nossa confiança não serve de nada.

Apenas preciso dizer que esses pecados prazerosos que por longo tempo tem sido acariciados nos rincões secretos do coração, devem ser trazidos a luz, e ali sacrificá-los. Isto é, com frequência, como arrancar o olho direito. Mas não deve haver compaixão, porque Cristo é luz, e aquele pecado é trevas. Como podem andar unidos?

O pecado que se ama, que se desculpa e que se retém, prende a alma às rodas da carruagem em que Cristo não pode sentar. E o amor ao mundo, com suas loucas vaidades, suas exibições vazias, seus conselhos ímpios, seus prazeres sujos, seus falsos princípios, seus livros profanos, e toda a sua adoração idolátrica do talento, o engenho e vangloria, devem ser, também, cravado na cruz.

Terás que rejeitar essa conformidade como se fora veneno ou o contato de uma víbora.

O trono do coração

O trono do coração deve ser apenas para Cristo. O centro de todo gozo, estar nele; todo alento deve ser recolhido nele. O andar em Cristo é um apartar do país do que é humano, do parentesco do pecado, do lar do diabo. É uma marcha para a terra que Cristo nos dará; e requer muitas batalhas e conflitos, de modo que precisamos tomar as armas da fé e desprezar tudo o que nossa natureza tanto ama.

Mas, depois de tudo, o que é o que se rejeita? Nada a não ser sombras e vaidades; nada a não ser humilhação, tristeza e miséria; nada a não ser a carga de uma preocupação comovente, dessa carreira interminável depois do vazio e o temor do balanço futuro.

Mas o que ganha em Cristo é a perfeição de toda excelência. Jesus nos recebe nas câmaras íntimas de seu amor e nos abre o seu coração. Todo pecador que vai a ele, ouve uma voz que lhe diz: Entrega-te a mim porque eu me entreguei primeiro a ti. Não temas, Eu sou “tua recompensa gradíssima”.

Maior que um favor

Oh, minha alma! É teu este tesouro de plenitude? A escória se transforma em ouro, as nuvens em céu brilhante, o sussurro em canto, a terra na sala de espera do céu. Fixa-te na imensa certeza que outorga esse “Eu sou a tua recompensa grandíssima”.

Teria sido um favor maravilhoso se a promessa fosse: “Te darei uma recompensa”. Mas “Eu sou a tua recompensa” é algo muito maior que um favor. A perspectiva de uma glória futura teria sido um estímulo agradável, mas o conceder este dom como privilégio presente é uma mercê sobre todas as mercês.

“Eu sou a tua recompensa”. Se Deus lhe tivesse prometido que não perderia nada em seu serviço, já teria sido algo maravilhoso; mas o que lhe diz é: “Eu sou a tua recompensa grandíssima”. Assim, pois, esta é a nossa grande segurança. O próprio Cristo é a grandessíssima recompensa que enche todo o coração crente. Tudo o que ele é e tem, nos pertence. Nosso é seu amor, que não tem princípio; nossa por sua graça sem limites; nossa por sua promessa imutável; nosso por seu dom irrevogável. Sim, é nosso porque ele se deleita em nos abençoar, e se regozija em nosso gozo.

Prazerosamente falaria da recompensa que Cristo dá ao entregar-se a si mesmo. Mas as línguas de homens e anjos fracassam neste intento. Cristo é Deus. Sua divindade é um tesouro e por isso diz a seu povo: “Abram as mãos, minha deidade é tua”. Visto que é Deus, o seu poder é ilimitado, e o usa para bem dos seus, para protegê-los da fúria do mundo e do inferno. Seu poder é uma grande barreira que os separa cada dia da destruição. Vence a Satanás lhe fazendo retroceder. Persuade ao pobre lhe atraindo para mais perto.

A sabedoria de Cristo é inescrutável. Não obstante, toda ela é para o seu povo. Tudo ele planeja e dispõe para que, tanto a ruína de um império como a queda de uma ave, seja para bem deles. Seu Espírito lhes pertence, e foi enviado para despertar, para revelar a salvação, para animar, santificar e conduzir aos pastos de verdade e santidade.

O seu deve ser nosso

Cristo é Deus-homem. Como tal morreu, sofreu grandes agonias e enfrentou a maldição, introduzindo assim a justiça e adquirindo um coração parecido ao nosso para nos compreender. Pois bem, tudo é nosso. Sua morte é nossa para que nunca morramos. Suas agonias são nossas para expiar o nosso pecado. Sua maldição nos pertence para nos redimir. Deu-nos o seu sangue para nos fazer mais brancos que a neve pura. Sua justiça é nossa para nos adornar com a beleza que nos fará dignos do olhar admirado do Pai. Temos a sua compaixão para que sinta nossas fraquezas e se compadeça, como um irmão, de nossas dores.

Também sua vida presente é nossa, para que vivamos. Sua intercessão nos pertence, e daqui brote um rio de bênçãos. Sua defesa é nossa, e por isso o perdão não cessa. O rosto de Deus se ilumina com um sorriso.

Um pouco mais, e Jesus voltará outra vez. Sua volta nos é dado para receber-nos com corpos glorificados. Temos o céu como lar, e seu trono para reinar. Seus anjos são nossos ministros guardiães. Sua Providência se move para o nosso bem. Seus ministros nos chamam, alimentam e edificam. Em suas Escrituras vemos, como em um espelho, a sua obra e aprendemos os seus caminhos. Vivemos, pois, para receber dele a graça. Morremos para alcançar a glória; e ressuscitamos para ver toda a perfeição do Senhor e nos alegrarmos em sua presença.

Procura, leitor, ampliar estes poucos indícios, pois tendem a mostrar a maravilha desse “galardão grandíssimo” em Cristo. Desejaria participar desse estado feliz? Vem, então, renda tudo diante de Cristo. Faça tua por fé. Eleve as portas do teu coração e o Rei de glória entrará. Permaneça nele, e ele permanecerá em ti. Dá-lhe a tua confiança e ele te dará esta incalculável recompensa.

Cristo, o galardão

Será que suas bênçãos não são tão ricas agora como o eram antes? Acaso suas recompensas perderam algo de sua infinita grandeza? Impossível.

Exerça a fé de Abraão, e ouvirás e acharás, como ele ouviu e achou: Eu sou o teu galardão grandíssimo”. Como aquele agradecido Jacó testificarás dizendo: “Deus me tem feito mercê, e tudo o que tem aqui é meu”. Como Moisés experimentará que o vitupério de Cristo é maior que os tesouros dos reinos. Então pulsarás a corda da harpa de Davi cantando: “Jehová é a porção da minha herança e do meu cálice”. Teu coração transbordante de gozo testificará que apenas te havia dito a metade.

Mas não precisamos ir às primeiras fontes da fé para mostrar que Cristo é este “galardão grandíssimo”. É, simplesmente, a experiência de todos os seus servos. Há lares onde, apesar da penúria, o piedoso pai sorri consolado e entoa o canto celestial sobre sua singela provisão.

Muitos são os oprimidos e ofendidos em cuja boca não se acha nem uma recriminação, nenhuma queixa senão uma mansa expressão de louvor. Há muitos que se consomem de dor e, entretanto, seus gemidos são verdadeiras melodias de gratidão. Há muitos leitos de moribundos onde a morte fica abolida e a paz triunfa. Só a fé pode explicar tudo isto, porque conhece aquele que com a sua presença, torna leve toda carga e transforma a tristeza em gozo. Sim, é o Senhor que está ali pela fé. Ele é o “galardão grandíssimo”.

A fé, com suas asas, atravessam os céus e chega a entrar no próprio lar dos redimidos, contemplando uma cena maravilhosa: Multidões imensas com vestiduras brancas, com coroas de justiça, com palmas de vitória e hinos de interminável louvor, seguem o Cordeiro a qualquer lugar que este vá.

Esta é a recompensa que Cristo dá. Ele comprou tudo, preparou tudo, e nos deu tudo isso. Em seguida nos preparou a todos para gozá-la.

Não é Jesus, pois, o “galardão grandíssimo”? Pode-se, agora, escolher o mundo e deixar a Ele? Olhe, leia, pense de novo. Oh! Espírito Santo, não permita que ninguém deixe estas páginas até que, por seu poder, Cristo fique estabelecido no coração como o “galardão grandíssimo”!

Do Evangelho em Gênesis.

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