ÁGUAS VIVAS
Para a proclamação do Evangelho e a edificação do Corpo de Cristo
O Altar
Jesus, como o altar da expiação, é o tudo no resgate de uma alma da morte.
Henry Law
"E edificou Noé um altar a Jehová" (Gên. 8:20).
Para chegarmos a conhecer aquele poder santificador da graça, devemos investigar a sua obra em homens piedosos. Uma máquina complicada parece um quebra-cabeça insolúvel, até que se entenda como trabalha cada uma de suas peças.
Do mesmo modo, com um estudo cuidadoso de bons modelos, chegamos a compreender como podemos levantar templos espirituais com os vis materiais da terra, e como pobres pecadores como nós podemos fazer proezas no campo das aflições.
A cena pode variar segundo as circunstâncias, mas há certos sinais que não podem obscurecer-se. O filho de Deus deve exibir sempre uma obediência total à vontade do Pai celestial, uma firme confiança em sua Palavra, uma doce submissão a sua direção e um constante aproximar-se dele por meio do sangue reconciliador, com o gozo da oração e o louvor. A verdadeira árvore da fé deve estar carregada desses frutos. A alma nascida de novo deve provar a sua ascendência com estas características, e um andar celestial deve ser ao longo deste caminho consagrado.
A figura de Noé
Esta verdade está claramente escrita na história de Noé. Deus lhe disse: «Faça-te uma arca». E embora a obra fosse estranha, ele a começou imediatamente. Em seguida Deus ordenou: «Entra tu e toda a tua casa na arca».
Noé entrou com grande confiança sem ignorar que, embora houvesse perigos lá fora, também poderia havê-los dentro; mas seguindo ao Senhor sem reservas se encontrou a salvo e em paz.
A mesma voz falou de novo: «Saia da arca». E ele saiu do seu refúgio para pousar sobre o tumulo de um mundo enterrado. Uma solidão silenciosa reinava naquela terra que Noé conheceu quando era a guarida do mal. O epitáfio do pecado estava escrito sobre aquelas vastas ruínas.
Pode-se crer, com razão, que o seu primeiro ato foi adorar, e o complexo momento em que se encontrava dá mais realce a sua atitude. «E edificou Noé um altar a Jehová». Muitos assuntos requeriam o seu cuidado. Não tinha casa, nem currais para aquele gado, e ele tinha que fazer tudo. Tinha que planejar, arrumar, esforçar-se e trabalhar.
Se houve um homem que podia ter excluído a Deus por causa de suas muitas ocupações, este homem era Noé. Se houve um momento muito ocupado para pensar no céu, esse era o momento. Mas não; tudo deve render-se a Aquele que é sobre tudo, as primícias devem ser para Aquele cujo nome é Primeiro.
O primeiro edifício sobre aquela terra foi um altar para o seu Criador, e a primeira atitude do patriarca foi ajoelhar-se sobre o chão com as suas mãos elevadas ao céu.
Um engano sutil
Se parecer que franqueio os limites do meu tema é porque sei que Satanás detém frequentemente a mão que se dispõe a chamar as portas da misericórdia, persuadindo de que ainda não é a hora, de que este momento deve dedicar-se à família, ao trabalho, à distração. Mas não o escute. Não é desperdiçado o tempo quando é dado a Deus. Não há obra proveitosa se não começa, continua e termina nele. Dedica-lhe a tua primeira e última hora. Nunca estará em dívida contigo.
O verdadeiro Altar
O altar foi edificado para sacrificar ofertas sobre ele. Não se pode duvidar que aquela vítima e seu sangue derramado esboçasse a morte do Cordeiro de Deus.
É também certo, embora não seja tão evidente, que o altar também proclama a Aquele que é a soma e a substância do milagre da redenção. Jesus constitui cada parte da expiação do pecado. Do mesmo modo que é o verdadeiro Sacerdote e a verdadeira Vítima, assim também é o verdadeiro Altar. Ele se oferece para morrer sobre Si mesmo.
Por isso, esse sacrifício por ti é perfeito, por ser completamente divino. Tem um Sacerdote, e apenas um, que entrou nos céus e se assenta à mão direita da Majestade nas alturas. Tem um Cordeiro, e apenas um, porque não é necessário mais, que morreu uma vez, visto que uma vez foi absolutamente suficiente para pagar a culpa e salvar do pecado. Assim também tem um Altar, e apenas um, que está diante do trono de Deus. Jesus é o Altar.
Isto não é um sonho fantástico, mas o pronunciamento fiel do nosso Deus. O mesmo Espírito nos leva até o altar e nos faz ler nele esta lição evangélica, que os lábios do Apóstolo pronunciaram sob Sua direção: «Temos um altar» (Heb. 13:10).
Por conseguinte, temos um altar entre os nossos tesouros. Mas, onde está? Tem que estar onde está o Sacerdote, e onde está o sangue. Não está aqui, mas depois do véu no céu, e por isso só pode ser o Senhor Jesus. Este é o poço de verdade que o Espírito nos abre. Tiremos água dele com gozo.
Um leito de morte
O altar tem diversos usos, mas o principal é o de servir de leito de morte da vítima. Por isso, quando Jesus veio a morrer, teve que possuir tal leito.
Vamos com fé ao Calvário, que é o berço das nossas esperanças. Ali, na plenitude dos tempos, vemos nosso Sumo Sacerdote que leva um manso Cordeiro, e o Cordeiro é ele mesmo. A sua carga não é comum. «Mas Jehová carregou nele o pecado de todos nós».
O peso de um só pecado lançaria uma alma nas profundezas do abismo da condenação eterna. Mas, quem poderia contar os pecados cujo peso Jesus gemeu? O seu número é infinito e a sua gravidade incomensurável.
Assim, sobre que altar podemos apresentar este sobrecarregado varão de dores? Se os anjos aplicassem toda a sua fortaleza para o sustentar, quebrar-se-iam como canas. Se os mundos se amontoassem, ficariam como pó. Nem o próprio céu podia ajudar; tudo era trevas acima quando Jesus clamou: «Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?». A terra toda tinha fugido e, ao olhar, Cristo não viu ninguém.
Mas tudo o que necessitava ele tinha em si mesmo. A sua divindade é o altar da sua humanidade expirante. Ele é o seu próprio socorro e ajuda, e não fraqueja sob o dilúvio da fúria da ira de Jehová. Com mão serena bebe até o final a taça da fúria divina, e assim paga por aquele pecado até que a própria justiça diz: Basta! Forte em seu próprio poder, ele satisfaz até que a satisfação superabunda. Apoiado inabalavelmente em sua divindade, apaga a iniquidade até que esta desaparece.
Exaltando a Jesus
Desejo exaltar a Jesus mostrando-o como o altar da expiação, para que entenda que ele é o tudo no resgate de uma alma da morte. Acredite-me, não é fácil nem comum ele ver esta verdade em sua límpida glória. Satanás e todo o inferno se esforçam sem descanso para ofuscá-la com névoas. Nossa pobre natureza está pronta a beber a poção que faz crer que, com um pouco de ajuda de Cristo, tudo irá bem.
O eu, enganando-se a si mesmo com seus próprios atos, chega a crer que os méritos do homem, encobertos com os méritos de Cristo, são a chave do céu. Mas isto não é mais que construir um altar de lixo humano com ferramentas humanas, e em seguida colocar a Cristo sobre ele.
Esta mentira, colocando a Cristo adiante, anda por toda a terra matando aos milhares. Isto é a árvore venenosa cuja sombra descansa muitos, sonhando que têm feito de Cristo a sua única esperança, quando na realidade puseram a sua confiança em si mesmos.
Este é o espírito que zomba dos perdidos, mostrando-lhes, muito tardia, que o Cristo exaltado da palavra não é necessariamente o Cristo que reina no coração. Este é o inimigo que tão frequentemente faz do ministério um campo estéril. Os homens imaginam que ouvir de Cristo e louvar este nome, equivale à graça que salva. Desta forma, o eu, em alguma de suas formas, é o altar preferido da terra pecadora.
Este é o grande engano da religião formal. Esta é a rede que aquele poder das trevas tem estendido de forma tão engenhosa. Esta heresia admite o suficiente de Cristo para acalmar a consciência, mas retém o suficiente do eu para matar a alma. Não nega que Jesus viveu e morreu para nos salvar, mas tampouco admite que só Jesus seja suficiente. Por isso levanta muito alto e cativantes altares dos sentidos e da imaginação, fazendo deles a verdadeira base da esperança do pecador. Em seguida os coroa com Cristo e, como os homens de Babel, crê que alcançará o céu.
Em tudo isto existe certa semelhança de exaltação de Cristo. Mas é Cristo acrescentado às formas religiosas externas, enfim, Cristo servindo de pináculo à pirâmide das ideias humanas.
Múltiplas funções do altar
Mas o verdadeiro altar tem múltiplos usos. Ali eram recebidas as ofertas e os primeiros frutos do adorador. Dele se tirava a provisão de mantimentos. Para ali o culpado fugia; o seu terreno era um santuário. Jesus é tudo isto.
Leitor, a chamada que te faz é que apresentes a tua alma, teu corpo, tudo o que és, tudo o que tens, tudo o que podes fazer, em sacrifício a Deus. Não podes regatear-lhe nada a quem foi dado, para resgate, mais do que o céu é. Incruste esta verdade em sua mente: Exceto no Amado, não há pessoa nem serviço aceitável.
Uma oferta suave
Palavras e obras carecem de valor se não forem oferecidas por fé, pelos méritos e no nome de Jesus. O fruto que não está santificado por seu sangue e dedicado para a sua glória, é apenas podridão. É unicamente o rico incenso que sobe deste altar, o que pode fazer de ti, e de sua vida, uma oferta suave a Deus.
Leitor, ore muito. Isto é aquele respirar da alma, porque cada momento constitui uma necessidade que deve criar um clamor que suba ao céu. Mas somente há um altar onde as petições adquirem aquele poder da vitória. Os que suplicam no nome de Cristo acham resposta no céu. Mas a oração desligada de Cristo é como fumaça que se desvanece no ar.
Que seu agradecimento seja, também, abundante, porque o mandamento é: «Deem graças em tudo». O rio de suas misericórdias flui incessante e, como pode extinguir o rio do nosso amor agradecido? Mas não há louvor aceitável se não subir do altar.
Sustento da alma
A alma necessita de alimentação regular, e só aqui a podes encontrar. O Evangelho nos convida para um grande banquete! A palavra, as promessas, as ordenanças e os símbolos estão preparados para este banquete abundante. Mas Cristo é a essência do alimento e, sem ele, os meios da graça não são mais que cascas secas.
O altar tinha, além disso, pontas. O ofensor que se agarrava a elas estava a salvo; a mão vingadora não podia lhe tocar. Assim também, todo aquele que se refugia em Cristo pode despreocupar-se de todo inimigo. Nem as ameaças da lei, nem a espada justiceira, nem o furor do perseguidor podem lhe danificar.
Quão feliz é o crente que tem feito deste altar o seu lar seguro e deleitoso! Sob seu amparo pensará com frequência: «Aqui descarreguei o peso dos meus pecados; aqui viverei, com aquele poder do Espírito, uma vida entregue e de adoração. Aquele que é o Altar onde morro para o pecado, será o Altar onde viverei para Deus. Cristo é tudo para o meu perdão e para a minha santidade».
Do Evangelho em Gênesis.