Por que Deus permite o mal

Deus quer recuperar a sua imagem em nós, e parte desse processo consiste em nos fazer passar pelo fogo e pela água.

Roberto Sáez

“No qual vos alegrais, embora agora por um pouco de tempo, se for necessário, tenhais que ser afligidos em diversas provações, para que submetida a prova a vossa fé, muito mais preciosa que o ouro, o qual embora perecível se prova com fogo, seja achada em louvor, glória e honra quando for manifestado Jesus Cristo» (1ª Pedro 1:7)

Por que existe o mal? Por que Deus permite o mal? Tentando dar resposta a estas interrogações, à luz da palavra de Deus, podemos dizer que é um tema próprio da soberania de Deus. Deus permitiu o mal porque ele quer manifestar a sua glória, porque sem o conhecimento do mal nunca poderíamos ter apreciado a glória de Deus.

Também podemos perceber que Deus permite o mal para formar o caráter de Cristo em nós. Aquilo que se perdeu no mau moral, na queda, Deus quer recuperá-lo, formando a sua imagem em nós, e ele usa os sofrimentos para a formação desse caráter. Embora o mal esteja vencido, ainda segue presente; mas, um dia, Deus enxugará as nossas lágrimas, e nunca mais haverá pranto nem dor, porque o mal terá desaparecido para sempre.

Mudando os títulos

Por que Deus permite o mal para os seus filhos? É porque ele quer formar o caráter de Cristo em nós. Deus nos transportou da morte para a vida, mudando os títulos negativos que tínhamos, como filhos da ira, filhos da desobediência, filhos da perdição, filhos do diabo. Esses títulos foram trocados quando ele nos regenerou e nos transformou mediante a luz do evangelho.

A palavra do Senhor diz que, da mesma maneira como Deus disse: «Haja luz», assim também «resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo» (2ª Cor. 4:6). Disse Deus: «Haja luz»; mas, para nós, é como se houvesse dito: «Haja cruz», porque foi a obra da cruz, o evangelho da cruz, o que iluminou os nossos corações.

Quando a luz de Deus resplandeceu em nosso interior tenebroso, isto produziu uma mudança radical em nossas vidas, uma operação divina, um milagre, no qual nós não tivemos nenhuma participação, porque não foi por nossas obras, nem foi porque nós procuramos a Deus. Ele nos buscou; ele é que fez tudo.

Três categorias de filhos

As Escrituras agrupam os filhos de Deus em três categorias: os filhos recém-nascidos, os filhos disciplinados e os filhos manifestados. Os filhos recém-nascidos chegaram a ser tais por um milagre de Deus. Não havia nenhuma possibilidade para nós de experimentar esta mudança. Foi por uma obra inteiramente de Deus. A fé nasceu em nós quando o Espírito Santo nos tocou com a palavra do evangelho. E nós obedecemos, crendo no Senhor. A fé não é nossa, mas um dom de Deus. Glória ao Senhor!

«Escrevo-vos a vós, filhinhos, porque os vossos pecados vos foram perdoados por seu nome. Escrevo-vos a vós, pais, porque conheceis aquele que é desde o princípio. Escrevo-vos a vós, jovens, porque vencestes ao maligno. Escrevo-vos a vós, filhinhos, porque conhecestes ao Pai. Tenho-vos escrito a vós, pais, porque conhecestes aquele que é desde o princípio. Tenho-vos escrito a vós, jovens, porque sois fortes, e a palavra de Deus permanece em vós, e vencestes o maligno» (1ª João 2:12).

João mostra esta escala ascendente de filhinhos, jovens e pais. Os filhinhos se relacionam com o Pai e têm gratidão com ele porque lhes perdoou os seus pecados. São os recém-nascidos de Deus. Os jovens são fortes e venceram ao maligno; eles já alcançaram certa maturidade. E os pais são os filhos mais velhos, que alcançaram a maturidade; eles são capazes de gerar filhos e abundam em frutos espirituais.

Os filhinhos são ainda pequenos. João diz que todo aquele que crê no nome de Jesus recebe do Pai o poder de serem feitos filho de Deus. Nesse texto, filho de Deus se refere a um bebê recém-nascido (em grego, teknós). Mas em Hebreus 2:10, a expressão «levar muitos filhos à glória», não se refere a bebês mas a filhos maduros.

Deus quer nos levar de menos a mais; ele não quer levar um jardim da infância, mas filhos maduros, à glória. Então, espera-se que cheguemos a uma estatura espiritual que permita a Deus pôr em nós a sua vida, a sua autoridade, a sua graça, o seu nome, e nós possamos atuar em sua representação. Nisto consiste a maturidade espiritual. Isto é o que Deus quer para nós. Agora, como Deus obterá isto? Como se alcança este crescimento? Então, aqui aparecem os filhos disciplinados.

Filhos disciplinados

A palavra do Senhor nos diz que Deus «açoita a todo o que recebe por filho» (Heb. 12:6). Então, os açoites são os sofrimentos. Aqui vemos que Deus está permitindo o mal. Diz a Israel: «Quando passares pelas águas, eu estarei contigo; e se pelos rios, não te submergirão. Quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem a chama arderá em ti» (Is. 43:2). Deus permite que passemos pelo fogo e pela água. Esta sua disciplina é formativa e corretiva.

Alguns comentaristas das Escrituras não gostam de dizer que Deus castiga os seus filhos. Eles preferem falar de disciplina, e de que essa disciplina é algo como um conselho. Eles apresentam a Deus como um vovozinho de barbas brancas que sempre está perdoando tudo o que seus netos fazem, dizendo: «Não importa o que façam, porque são pequeninos», e então ele deixa passar tudo.

No entanto, se nós tivermos uma ideia equivocada de Deus, não teremos um conhecimento adequado dele. Deus é amor, mas também é fogo consumidor. Ele trata os seus filhos com amor; mas quando eles não obedecem e andam por maus caminhos, precisam ser disciplinados. Os filhos de Deus têm que aprender a discernir o que Deus quer, devem ser capazes de escolher, de tomar decisões, para andar corretamente.

Deus salva e corrige

Deus corrigiu a Israel com grandes juízos. Com mão poderosa os salvou, mas também com mão severa os corrigiu. Depois,quando retornavam aos ídolos, ele sempre os chamou para que abandonassem a idolatria. E quando o seu povo não obedecia, enviava-lhes castigos, secas, chuvas e até exércitos inimigos, para que Israel se voltasse para Deus.

O coração do homem é muito duro. Deus nos conhece, mas nós não nos conhecemos. A psicologia diz que nós temos um ponto cego, que nos impede de ver o que outros veem em nós. Isso é o que ensina o Senhor Jesus, quando diz que vemos o cisco no olho alheio e não a trave que está no nosso. Somos incapazes de vermos a nós mesmos. Somos tão duros, difíceis de quebrar; por isso, Deus usará o quebrantamento, e nos fará passar pelo fogo e pela água.

«No qual vos alegrais, embora agora por um pouco de tempo, se for necessário, tenhais que ser afligidos em diversas provações, para que submetida a prova da vossa fé, muito mais preciosa que o ouro, o qual embora perecível se prova com fogo, seja achada em louvor, glória e honra quando for manifestado Jesus Cristo» (1ª Ped. 1:6-7). Aqui temos o símbolo do fogo, que significa a prova, as aflições, os males que Deus permite, com um propósito – formar a Cristo em nós.

O bem de Deus

Há outro texto conhecido, em Romanos 8:28-29: «Aos que amam a Deus, todas as coisas contribuem para o bem». Este texto foi explicado de uma maneira errado, entendendo que todas as coisas ajudam para o nosso bem. No entanto, não se refere ao nosso próprio proveito, mas para o bem de Deus. Tudo o que ocorre aos crentes contribui para o bem de Deus. Agora, qual é o bem de Deus? A formação de Sua imagem em nós.

O mal se introduziu no mundo quando o homem caiu no pecado, e a imagem de Deus se tornou distorcida na natureza humana. A história da salvação tem a ver com a ação de Deus para recuperar essa imagem em nós.

Tudo o que Deus mostrou de si mesmo: a lei de Moisés, a palavra dos profetas, a palavra de sabedoria, tudo o que está escrito no Antigo Testamento, foi para que nos voltássemos para Deus. Não obstante, toda essa Palavra, embora seja palavra de Deus, não foi capaz de converter o coração extremamente duro do homem. Então, o próprio Deus teve que vir, em Cristo, para poder nos redimir e fazer esta obra de transformação.

A cruz

Deus quer recuperar a sua imagem em nós. A obra de Cristo na cruz foi para a nossa salvação. Mas agora, a vida de Cristo em nós tem que operar a transformação. Aqui temos agora o caminho da cruz. O Senhor nos convida a nos negarmos a nós mesmos. Por isso, Paulo dizia: «Já não vivo eu, mas Cristo vive em mim» (Gál. 2:20). Quando um crente consegue aprender esta lição, então já adquiriu uma medida de maturidade.

Podemos falar ou escrever muito a respeito da cruz, podemos compor poemas e canções ou pregar grandes mensagens a respeito da cruz. O irmão Watchman Nee, em uma reunião de obreiros na China, disse: «viemos falando da cruz por dez anos, mas ainda não vemos a realidade dela em nossas vidas». Quão duros somos. Uma coisa é sabermos o que a Bíblia diz a respeito; mas isto não que dizer necessariamente que vivemos o que sabemos dela.

Como o ouro

O Senhor compara a nossa fé com o ouro. Para purificar o ouro, temos que colocá-lo no fogo. A nossa fé é comparada com o processo pelo que passa o ouro. Por que Deus permite o mal? Porque o mal, que é a prova de fogo, ajuda a purificar a nossa fé.

O ouro é o elemento mais cobiçável que existe, mas a nossa fé é mais preciosa que o ouro. Quem não percebe isto, nunca poderá apreciar o benefício de passar pelas provações.

Agora, quando Deus nos faz passar pelo fogo, não é porque ele simplesmente queira nos fazer sofrer. Não, ele é amor, mas também é fogo consumidor. Em sua justiça, ele não pode permitir o pecado. Ele é santo.

A santidade não é somente uma qualidade de Deus, mas a soma de todas as virtudes divinas. Então, nós, os filhos de Deus, estamos sendo treinados para sermos santos. Ele nos chamou para isso, para sermos conformados à imagem de Jesus Cristo.

Então, quando somos colocados no fogo, devemos dar graças a Deus. E até devemos dar graças a Deus em tudo, não só pelas coisas boas, mas também pelas coisas más, porque tudo contribui «para o bem de Deus», que é recuperar a Sua imagem em nós. É o mais grandioso que possa nos acontecer.

Propósito através do mal

Hoje podemos ter uma visão mais clara em relação ao mal. Nada nos separará do amor de Deus; nem a morte, nem a enfermidade, nem a pobreza, nem a fome, nem as perseguições, nem nada criado, nem mesmo o mal que provém de Satanás e os demônios.

O Senhor tem poder sobre o mal sobrenatural, e não devemos ter temor deles, «porque maior é o que está em vós, que o que está no mundo» (1ª João 4:4). Os crentes podem passar pelas provas mais terríveis, assim como ocorreu com o povo de Israel, quando Deus os levou até o limite de suas forças, até o ponto que eles muitas vezes protestaram: «Para que nos trouxe Deus por este caminho?». Sem dúvida, sempre que o homem é posto no fogo da provação, a primeira pergunta que sai de sua boca é: «por quê?». Essa é a história de Jó. No capítulo 3 do livro de Jó, ele faz cinco vezes a pergunta: «por quê?».

Por que Deus permite o mal? Primeiro, porque ele é soberano. Segundo, porque, através do mal, Deus forma em seus filhos o caráter de Cristo. Terceiro, porque o mal faz mais visível a glória de Deus. No jardim do Getsemani, quando o Senhor estava a ponto de enfrentar a maior das provas, disse: «Agora está abatida a minha alma; e o que direi? Pai, salva-me desta hora? Mas para isto cheguei a esta hora. Pai, glorifica o teu nome. Então veio uma voz do céu: O tenho glorificado, e o glorificarei outra vez» (João 12:27-28).

Como Deus se glorifica? «Porque Deus, que mandou que das trevas resplandecesse a luz, é o que resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face do Jesus Cristo» (2ª Cor. 4:6).

Se Deus já resplandeceu nas trevas do teu coração, isso é algo maravilhoso. Como poderíamos conhecer a glória de Deus, se não tivéssemos noção do mal do qual fomos resgatados? A justiça e o amor de Deus convergem perfeitamente na cruz do Calvário. Não poderíamos apreciar isso se o mal não tivesse existido.

Síntese de uma mensagem ministrada em Tapejara (Brasil), em maio de 2014.

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