Os dons do Espírito (2)

Os dons do Espírito não são outra coisa que experimentar o Espírito Santo manifestando-se.

Rubén Chacón

Não quero, irmãos, que ignoreis a respeito dos dons espirituais” (1ª Cor. 12:1).

Hoje queremos entrar em mais detalhes sobre as manifestações do Espírito Santo que, segundo Paulo, são os carismas ou os dons do Espírito. Muitos comentaristas agrupam estes nove dons em três grupos. O primeiro inclui palavra de sabedoria, palavra de ciência ou conhecimento e discernimento de espíritos; no segundo grupo temos o fazer milagres, os dons de curar e o dom de fé; e, no terceiro, profecia, diversos gêneros de línguas, e interpretação de línguas.

1. Os dons de saber

Com respeito aos primeiros dois dons que Paulo menciona em 1ª Coríntios 12, temos que notar, a modo de introdução, duas coisas. Primeiro, que o dom não se chama dom de sabedoria, mas palavra de sabedoria. Não significa que a alguém será dada sabedoria, mas sim o Espírito manifestará em algum crente uma palavra de sabedoria, ou seja, ele dirá algo pelo Espírito Santo. O mesmo ocorre com a palavra de ciência.

Segundo, estes dois dons não devem ser confundidos com o ministério da Palavra. Isso seria confundir os dons do Espírito com os dons de Cristo (Efésios 4:11). A palavra de sabedoria e a palavra de ciência ou conhecimento são dons do Espírito Santo, e têm haver com outra coisa, que é o que vamos analisar agora. A Escritura não dá uma definição de cada um dos dons. Paulo os menciona, mas não diz no que consistem, o que não significa que não possamos saber.

Palavra de sabedoria

A modo de exemplo, vejamos Atos 10:19. Pedro estava refletindo sobre a visão que Deus lhe tinha dado enquanto orava. «E enquanto Pedro pensava na visão, disse-lhe o Espírito». Esta é uma manifestação explícita do Espírito. Pedro estava sozinho. Os dons não se limita apenas ao momento em que nos reunimos como assembleia; podem se manifestar  estando sozinhos, em família ou com outros irmãos.

O Espírito disse a Pedro: «Eis aqui, três homens o buscam. Levanta-te, pois, e desce e não duvides de ir com eles, porque eu os enviei». Esta é uma palavra de sabedoria, porque está dando a Pedro conhecer um fato –»Três homens o buscam»–, e em seguida contém uma instrução a seguir, algo que ele deve fazer.

A palavra de sabedoria responde à pergunta: «O que fazer em determinada situação?». Nós estivemos muitas vezes em uma alternativa em que não sabemos que caminho tomar, que coisa escolher ou como resolver um problema, seja a nível pessoal, familiar ou como igreja. Quando não sabemos o que fazer, necessitamos de uma palavra de sabedoria, que nos diga: «Siga este caminho».

Outro exemplo, em Atos 13:2: «estes ministrando ao Senhor, e jejuando, disse o Espírito Santo…». Aqui temos outra manifestação do Espírito, esta vez não a uma pessoa só, mas a um grupo de irmãos que compartilham o ministério de profetas e mestres. E o que disse o Espírito Santo? «separai-me a Barnabé e a Saulo para a obra a que os chamei».

O Espírito está dizendo: «Apartem a estes homens para mim». Estes são os primeiros dois apóstolos do Espírito Santo. Há apóstolos de Cristo, os Doze; e há um apóstolo do Pai, Cristo. E estes são apóstolos do Espírito Santo. «Eles, então, enviados pelo Espírito Santo…» (V. 4). Aqui temos outro exemplo de palavra de sabedoria, porque dá a conhecer uma situação que leva a uma direção, um caminho a seguir.

Outro exemplo muito claro, em Atos 16:6, durante a segunda viagem apostólica de Paulo: «E atravessando a Frigia e a província da Galácia, foi proibido pelo Espírito Santo falar a palavra na Ásia». Que interessante é isto! Aqui temos uma manifestação do Espírito. «E quando chegaram a Mísia, tentaram ir a Bitínia, mas o Espírito não o permitiu» (V. 7). Outra manifestação do Espírito.

Um complemento

Alguém poderia dizer: «Como, irmão? Se tivermos a palavra: Ide e preguem o evangelho a toda criatura. Que mais necessitamos? Vai, pois, e nada mais, irmão!». É obvio, aqui está o Logos de Deus, que é Cristo. É claro que temos que ir por todo o mundo pregando o evangelho; mas o como, o quando e o onde, o Espírito Santo é quem determina. Aqui, o exemplo é muito claro. Eles estavam cumprindo a grande comissão, mas sujeitos ao Espírito e este sabia perfeitamente como dirigi-los.

As coisas não se contradizem; ao contrário, os dons do Espírito complementam o quadro. Temos a palavra de Deus, sabemos o que devemos fazer, mas é o Espírito Santo de Deus quem nos indicará o como, o quando e o onde.

Então, chegaram a Trôade. «E mostrou a Paulo uma visão de noite: um varão macedônio estava em pé, lhe rogando e dizendo: Passa para a Macedônia e nos ajude. Quando tivemos a visão, em seguida procuramos partir para a Macedônia, dando por certo que Deus nos chamava para que lhes anunciássemos o evangelho» (V. 9-10). A prioridade estava na Macedônia. Esta manifestação do Espírito corresponde também a uma palavra de sabedoria.

Palavra de ciência

«E permanecendo nós ali alguns dias, desceu da Judéia um profeta chamado Ágabo, que vindo para nos ver, tomou o cinto de Paulo, e atando os pés e as mãos, disse: Isto diz o Espírito Santo: Assim atarão os judeus em Jerusalém ao varão de quem é este cinto, e lhe entregarão nas mãos dos gentios» (Atos. 21:10-11).

Aqui há outra manifestação do Espírito Santo. É uma palavra de ciência, que simplesmente dá a conhecer um fato e não contém instrução. O Espírito Santo, através de Ágabo, diz a Paulo o que lhe ocorrerá ao chegar lá. Isto servia ao menos para três propósitos. Todas as coisas têm sentido no Senhor e todas as manifestações do Espírito são para edificação, para proveito.

Primeiro, a palavra de ciência preparou de antemão a Paulo para aquilo que lhe esperava. Em segundo lugar, a advertência do Espírito serve para que outros, ao inteirar-se de que efetivamente Paulo teria sido encarcerado, soubessem que aquilo era por causa do reino de Deus e não por algum pecado de Paulo. E terceiro, o que nós deveríamos fazer se soubéssemos que a alguém esperam tribulações? Orar pela situação do irmão.

Temos outro exemplo de palavra de ciência quando o Senhor Jesus fala com a mulher samaritana. Em um momento, lhe diz: «Vai, chama a teu marido, e vem aqui». Ela responde: «Não tenho marido». E o Senhor lhe diz: «Disse bem: Não tenho marido; porque cinco maridos tivestes, e o que agora tem não é teu marido; isto tem dito com verdade Aquela foi uma palavra de ciência.

O Senhor conhecia a vida desta mulher. E para que serve isto? A mulher, espantada, disse: «Senhor, parece-me que tu és profeta!». Quer dizer, o sinal que o Senhor lhe deu com essa palavra de ciência a preparou para ela receber o que Cristo tinha para lhe oferecer, que não era lhe lançar em rosto o seu pecado, mas lhe dar da água da vida que ele tinha para ela. E a mulher se converteu e deu testemunho do Senhor.

Discernimento de espíritos

A palavra de ciência tem haver com pessoas, situações ou coisas. Mas, quando se relaciona com o âmbito dos espíritos, já não se chama palavra de ciência, mas discernimento de espíritos. Esta manifestação do Espírito consiste na capacidade de conhecer os espíritos. E entendemos por espíritos não só demônios ou espíritos malignos, mas também o espírito humano ou a atitude de uma pessoa.

Por exemplo, quando Jesus viu vir a Natanael, ele disse: «Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há engano» (Jo. 1:47). Que beleza! O Senhor Jesus conhecia o que havia no coração, no espírito do homem. Isso é discernimento de espíritos, e neste caso, é positivo.

Em Atos 16:16-18, temos o caso da mulher que tinha espírito de adivinhação. Por muitos dias, quando essa mulher via Paulo passar com os seus companheiros, dizia: «Estes homens são servos do Deus Altíssimo, quem vos anuncia o caminho da salvação». Aquilo era verdade, mas o problema é que ela dizia aquilo por um espírito de adivinhação. «E isto o fazia por muitos dias; mas desagradando a Paulo, este se voltou e disse ao espírito: Mando-te no nome de Jesus Cristo, que saia dela. E saiu naquela mesma hora».

Vocês se lembram quando o Senhor anunciou aos seus discípulos que ele ia a Jerusalém e ali iria morrer? Pedro lhe disse: «Senhor, de maneira alguma isto lhe aconteça». Pedro falou aquilo de coração; mas o Senhor discerniu por trás daquelas palavras uma manobra do maligno. Assim repreendeu a Satanás, que estava por trás das palavras de Pedro: «Retira-te de diante de mim, Satanás!». E, de passagem, corrigiu a Pedro: «Não põe os olhos nas coisas de Deus, mas nas dos homens».

O discernimento de espíritos não termina no próprio discernimento, mas deve conduzir a uma ação. Se o Senhor nos permite discernir algo, é para atuar, seja para corrigir, como no caso de Pedro, ou para libertar a pessoa, como no caso da mulher que tinha um espírito de adivinhação, ou para disciplina, como no caso de Ananias e Safira, que foram disciplinados pelo Espírito Santo.

2. Os dons de poder

Este grupo compreende o fazer milagres, os dons de curar e o dom da fé. Todos eles produzem milagres, e os três requerem a fé, que permite que se produzam atos prodigiosos.

Quando os milagres têm haver com enfermidades, são dons de curar. E a diferença entre fazer milagres e o dom da fé reside na forma como operam os milagres. O realizar milagres é a pessoa que, capacitada pelo Espírito Santo, opera como protagonista. Por exemplo, Jesus caminhando sobre as águas, é quem executa e experimenta o milagre.

Ao contrário, o dom da fé consiste em que a pessoa tenha tal confiança em Deus, que tudo o que ela faz é crer em Deus. Ela não executa diretamente o milagre, mas, por meio da fé poderosa que tem em Deus, aquele dom da fé move o poder de Deus.

Vemos um exemplo do dom da fé no livro de Daniel, quando ele foi lançado na cova dos leões. «Então Daniel respondeu ao rei: Oh! rei, vive para sempre. Meu Deus enviou o seu anjo, o qual fechou a boca dos leões, para que não me fizessem mal, porque diante dele fui achado inocente; e até diante de ti, Oh! rei, eu não tenho feito nada mau. Então se alegrou o rei em grande maneira por causa dele, e mandou tirar a Daniel da cova; e foi Daniel tirado da cova, e nenhuma lesão se achou nele, porque tinha confiado no seu Deus» (Dan. 6:21-23).

Daniel não fez nada para produzir o milagre, exceto confiar em Deus, e essa fé possibilitou que viesse um anjo e lhes tampasse a boca dos leões. Este exemplo contrasta com a cena de Sansão matando ao leão. Ali não é dom de fé, mas sim de fazer milagres. Sansão, com força sobrenatural, é o protagonista.

Quando Pedro estava na prisão, o livro de Atos diz que a igreja fazia orações sem cessar por ele. Aí, em toda a igreja, operou o dom da fé. Enquanto a igreja orava, os anjos deveriam libertar a Pedro. Aí operou o dom de fé por meio da oração.

3. Os dons de inspiração

O terceiro grupo compreende o dom de profecia, variedades de línguas, e interpretação de línguas. 1ª Coríntios capítulo 14 mostra justamente a relação que há entre os dons deste grupo.

O dom de profecia

«Segui o amor; e procurai os dons espirituais, mas, sobretudo que profetizeis» (1ª Cor. 14:1). O amor é mais importante que os dons, mas optar pelo caminho mais excelente não significa desprezar os dons. «…mas, sobretudo que profetizeis». Paulo dá preeminência à profecia, mas não porque ela seja maior que as línguas, mas porque, quando estamos reunidos como assembleia, a profecia edifica a igreja; ao contrário daquele que fala em línguas, edifica-se a si mesmo.

Não nos reunimos para proveito pessoal, mas para render culto a Deus e para abençoar os irmãos. Eu não devo pensar que o culto deva ser para o meu agrado, mas pensando sempre em ser de edificação para outros. Paulo não está dizendo que desprezemos as línguas. No versículo 14:39, a conclusão é: «Assim, irmãos, procureis profetizar, e não impeçam o falar línguas». Temos que ser equilibrados. E termina dizendo: «Mas faça-se tudo decentemente e com ordem».

Profetizar ou falar em línguas?

Por que Paulo diz que na reunião de igreja os crentes devem preferir a profecia acima das línguas? «Porque o que fala em línguas não fala com os homens…». Quando alguém fala em línguas, não está falando com a igreja, «mas a Deus; pois ninguém lhe entende». Nem ele mesmo entende o que diz, porque este dom consiste em dirigir-se a Deus em um idioma não conhecido. O seu espírito está falando diretamente com Deus. «…ninguém lhe entende, ainda que pelo espírito fala mistérios».

Quando alguém está falando com Deus, o que ele fala nem sequer passa por sua mente, por isso ele não entende o que está dizendo. São mistérios.
Eu venho de outro contexto cristão, e devo reconhecer que muitas das supostas línguas que há por aí –embora no mundo haja milhares de idiomas e dialetos– são meras gírias (língua inexistente). No Pentecostes, os irmãos não falaram em gíria, mas os idiomas que havia na terra naquele tempo. Sabemos o porquê. Porque justamente tinham subido a Jerusalém judeus de todas as nações para celebrar a festa. Os que falavam em línguas ali estavam falando com Deus.

As testemunhas disseram: «…cretenses e árabes, ouvimos-lhes falar em nossas línguas as maravilhas de Deus» (Atos. 2:11). Eles fizeram a interpretação esse dia. Os galileus não falavam outros idiomas, mas todos entenderam do que se falava.

A interpretação de línguas

Então, qual a função da interpretação de línguas? Se o que fala em línguas está falando com Deus, falando mistérios, e se o Senhor manifesta a sua interpretação, o que interpretará dirá coisas de Deus que alguém está dizendo nesse idioma que não conhece.

Embora venha de um contexto onde abundavam as línguas, nunca ouvi alguém interpretá-las. E as poucas vezes que vi em outros contextos, creio que estão errados, porque ao interpretar o fazem como se Deus estivesse falando com os homens. Mas, se alguém falar com Deus em línguas, a interpretação deveria expressar o que tem sido dito a respeito de Deus.

A interpretação de línguas deve edificar a igreja. Tudo o que nos revele de Deus, proclamando a sua glória e a sua grandeza, edifica a igreja. Assim deixamos esta pista para a interpretação de línguas.

Falando da parte de Deus

«Mas o que profetiza fala aos homens para edificação, exortação e consolação» (1ª Cor. 14:3). Profecia é falar da parte de Deus; é dar a conhecer algo recebido da parte de Deus. Deus põe uma carga, uma palavra, um sentir, então alguém fala da parte de Deus aos homens.

Temos na mente o entendimento generalizado de que a profecia é predizer eventos futuros. É óbvio que a profecia, se vier da parte de Deus, pode incluir isso.

O elemento preditivo por excelência da profecia é anunciar a Cristo; mas, em geral, a profecia consiste em falar da parte de Deus à igreja, «para edificação, exortação e consolação».

Quando Paulo diz aos coríntios que prefiram a profecia, é porque eles em suas reuniões preferiam as línguas, que têm maior espetáculo. Para muitos, quanto mais espetacular é algo, mais de Deus parece ser, mais impactante é. Mas isso é sinal de imaturidade.

Se Deus tiver que nos falar com coisas espetaculares, é porque há maior incredulidade; mas onde há fé, a profecia é suficiente. Se formos espirituais, saberemos que é Deus quem está nos fazendo um chamado, um rogo, uma advertência. Alguns creem que se Deus falasse com voz audível, isso seria o topo da espiritualidade; mas Deus nos fala do interior, onde o seu Santo Espírito habita, em nossos corações. Esta é a glória do Novo Pacto. Deus nos fala, nos guia e nos dirige do interior.

Edificando à igreja

«Aquele que fala em língua estranha, a si mesmo se edifica; mas o que profetiza, edifica a igreja» (1ª Cor. 14:4). O dom de línguas é o único dom no qual a edificação é pessoal.

«Assim, queria que todos vós falassem em línguas, mas mais que profetizásseis; porque maior é o que profetiza do que aquele que fala em línguas, a não ser que as interprete para que a igreja receba edificação» (V. 5).

Há espaço para falar em línguas na assembleia. Alguém tem línguas? Pois, eleve a voz; assim abrirá a possibilidade de que haja interpretação.

Não nos apressemos em corrigir ou fazer calar a algum irmão. Se outro está falando, você guarde silêncio. Primeiro, demos espaço a isso. Se não houver interpretação, diz Paulo, baixe a voz, não o faça de forma pública, e fale para si mesmo. «Assim, as línguas são por sinal, não para os crentes, mas para os incrédulos; mas a profecia, não aos incrédulos, mas aos crentes» (V. 22). Para os crentes, a profecia é sinal suficiente de que Deus está presente.

«E os espíritos dos profetas estejam sujeitos aos profetas» (V. 32). Ninguém tem que perder o controle; o Espírito de Deus não faz a mesma coisa que a possessão demoníaca; ele nunca anula a nossa vontade.

Isto que revisamos não é algo dogmático. Estamos iniciando um caminho, estamos aprendendo. Quero também aprender de todos, ser ensinado por outros, e que juntos vamos descobrindo todo o conselho de Deus com respeito a estas coisas. Paulo diz: «Não quero, irmãos, que ignoreis a respeito dos dons espirituais». Por isso estamos aqui, aprendendo do Senhor. Amém.

Mensagem ministrada em El Trébol, Chile, Janeiro 2014.

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