A família na visão de Deus

Servir a Deus na família requer convicção, fé e coragem para exercer Seu governo.

Marcelo Díaz

Quando ouvimos notícias dos acontecimentos mundiais, somos testemunhas da degradação moral da conduta humana. A capacidade de nos surpreender vai-se perdendo cada vez mais, produto de ver continuamente o horror do comportamento. Em alguma medida nos habituamos a viver em um mundo sem absolutos, onde já quase não há limite para o pensamento e a conduta, como aquela época sem governo na história de Israel, da qual testemunham as Escrituras dizendo: «Naqueles dias não havia rei em Israel; cada um fazia o que bem lhe parecia» (Juízes. 17:6).

Hoje existe a grande necessidade de que o povo de Deus mostre o tesouro que contém. Nós temos uma cabeça, um Rei, um Senhor e um governo. Deus desenhou a igreja para ser um contenedor de sua verdade; portanto, é um corpo no qual há sabedoria, onde se aloja a mente do Senhor e se expressa o seu governo. Somente ela tem a capacidade de falar sobre a verdade, porque é coluna e baluarte dela.

No povo de Deus, encontramos homens e mulheres sãs segundo Deus, famílias fundamentadas que podem dar conselhos e instruir a outros. Como diz o profeta: «…nos ensinará os seus caminhos, e caminharemos por seus caminhos, porque de Sião sairá a lei, e de Jerusalém a palavra do Senhor» (Is. 2:3).

O apóstolo Paulo consciente desta verdade, exorta por carta a Tito e Timóteo que sejam modelos e estabeleçam nas igrejas padrões de referência para outros. Como um todo que é entornado de vaso em vaso, a verdade é transmitida de geração em geração, dando a conhecer os princípios do Senhor; não aquilo aprendido da cultura e da vida natural, mas o que é aprendido de Cristo.

Soube de um orientador em uma universidade, daquelas em que participam os nossos filhos, que dava às boas vindas aos novos estudantes, dizendo: «Bem-vindos à liberdade sexual, bem-vindos à homossexualidade e ao lesbianismo, bem-vindos à dependência de drogas e álcool. Bem-vindos à autonomia e a liberdade! Isto é a universidade; de vocês dependerá como hão de viver…».

Hoje, mais do que nunca, é necessário, equipar os nossos jovens com a verdade; dar-lhes não só o ensino das Escrituras, mas a verdade como uma experiência com a Vida. Para isto, no seio da igreja, Deus planejou a família. A família é, por excelência, o método de Deus para transmitir e equipar a sua vontade. Por isso é importante falar dela.

Revisemos alguns versículos na vida dos patriarcas do Antigo Testamento que nos mostram a intenção de Deus em e através da família, intenção que tem como objeto único o desenvolvimento de seu plano eterno na história.

O exemplo do Noé

«Disse em seguida o Senhor a Noé: Entra tu e toda a tua casa na arca, porque tenho te visto justo diante de mim nesta geração» (Gên. 7:1). Este versículo é muito iluminador, porque põe em evidência o coração salvador de Deus com a família. «Tu e toda a tua casa». Quando a maldade chegou até os olhos e ouvidos de Deus, ele se entediou e quis destruir tudo. No entanto, Deus encontrou um homem justo, Noé. O nome de Noé significa descanso. Então Deus disse: «Noé, descanso contigo. Salvarei a ti e –em ti– a toda a tua casa».

Deus sempre está pronto para salvar. Ele é o mais interessado na salvação dos homens. Deus ama e quer que todos os homens sejam salvos. É a sua misericórdia que posterga os tempos, esperando que todos cheguem ao conhecimento da Verdade.

«Entra tu e toda a tua casa…». Sabemos que a salvação é um ato pessoal. Cada um se defronta com o Senhor individualmente, seja para aceitar o seu senhorio, recebê-lo e oferecer-se em serviço, ou para rejeitá-lo e fugir. Mas aqui, com Noé, aprendemos que a vontade de Deus é também uma questão coletiva. Deus diz: «Noé, entra tu e toda a tua casa na arca».

No Novo Testamento, Pedro diz que oito pessoas foram salvas, quer dizer, Noé, sua esposa, seus filhos e suas noras. Ou seja, quando Deus escolhe e salva a alguém, está também querendo salvar aos que dependem dele, a quem este vai influenciar. Deus está olhando através desse homem e aos que estão ao seu redor: sua esposa, seus filhos. A intenção de Deus vai muito mais alem, e ela nos compromete.

Noé se sentiu comprometido. Ele recebeu a palavra: «Tu e toda a tua casa», e recebeu instruções para construir uma arca. Nisto vemos caráter. Que loucura, cem anos construindo uma arca! Ele tomou os seus filhos, educou-os e os sujeitou, porque o Senhor lhe tinha falado. Noé tomou suas mentes e corações, suas vontades para trabalhar naquilo que Deus tinha mandado. Ele aproveitou essa poderosa influencia que exerce a paternidade para transpassar a vida de seus filhos, e fez que eles tomassem as suas mulheres e as envolvessem no projeto de Deus.

Um pai com caráter exerce uma tremenda influência sobre a vida dos filhos. Em Noé, vemos um homem de caráter, um homem de convicções. Ele começou a trabalhar com a madeira, e enquanto levantava a arca construída com suas próprias mãos, simultaneamente levantava a salvação no coração da sua família. Batida a batida na madeira, batida a batida educando o coração de seus filhos.

Há necessidade de homens de caráter, que influenciem os seus filhos na verdade, que sejam capazes de penetrar o coração de um filho e cativá-lo para o Senhor. Na verdade, Noé trabalhou com seus filhos, e não permitiu que nenhum se desviasse, que nenhum se fosse. Buscou-os, encaminhou-os, amou-os. Como resistir o afeto de um pai amoroso?

Temos uma tremenda capacidade de influenciar os filhos. É comum ver os filhos correrem, inclusive já maiores e casados atrás dos desejos ou os caprichos de uma mãe. A capacidade de penetração no ser de um filho é profunda. No entanto, esta foi dada pelo Senhor para que nossos filhos estejam dentro do projeto de Deus, não para nossos desejos e gratificações pessoais, mas para que eles entrem nesta tão grande salvação.

«Tu e toda a tua casa…». Esta frase recorda a Paulo e Silas no calabouço, quando o carcereiro, temeroso pelo acontecido, rende-se a Paulo rogando o socorro do Senhor: «Senhores, o que devo fazer para ser salvo?». Eles disseram: «Crê no Senhor Jesus Cristo, e será salvo, tu e a tua casa» (Atos. 16:30-31). E o carcereiro tomou a sua família, e se batizou com todos eles.

Existe a cômoda desculpa de quem diz: «Meus filhos são filhos da promessa. Que façam o que quiserem agora; algum dia serão salvos». Mas isto não é o evangelho. Você tem crido numa fantasia evangélica, uma tradição ou algo assim. Se você não participar como pai ou mãe em influenciar a conduta e fé de seu filho, com caráter, exemplo e oração, esse filho cada dia se afastará mais e mais de Cristo. Quando o Senhor nos salvou, pensou em nossos filhos, e nos filhos dos nossos filhos. Essa é a verdade.

O compromisso de Abraão

«E disse o Senhor: Ocultarei eu a Abraão o que faço, visto que Abraão certamente virá a ser uma grande e poderosa nação, e por meio dele serão benditas todas as nações da terra? Porque eu o tenho escolhido, a fim de que ele ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, para que guardem o caminho do Senhor, para praticarem retidão e justiça; a fim de que o Senhor faça vir sobre Abraão o que a respeito dele tem falado.» (Gên. 18:17-19).

Com Abraão encontramos o exemplo da fé, da comunhão do homem com os segredos de Deus e o compromisso com o governo de sua casa, através da fé.

Deus não encobriria nada a Abraão, porque sabia que este ia mandar a seus filhos que guardassem a Sua Palavra. «…e a tua casa depois de ti…». Aqui vemos uma transcendência. A comunhão de um homem com os propósitos de Deus lhe obriga a exercer autoridade, a exercer governo sobre a sua descendência. Não podemos pretender crer que a vida termina conosco. Se o Senhor ainda não vier, a vida continua com a nossa descendência.

O que nossos filhos transmitirão aos seus próprios filhos? A ideia de projetar a vontade de Deus através da família é essencial na vida do crente. Nossos filhos vão instruir os seus filhos no Senhor, e assim sucessivamente, até ser uma nação grande e encher toda a terra do conhecimento de Deus.

Observem o pensamento de Deus com Abraão. Vendo que este se comprometeria a passar a palavra de Deus aos seus filhos, não lhe ocultaria os seus segredos. Que importante é a determinação de um pai referente à vida de seus filhos; está tão ligado aos pensamentos divinos, porque de alguma maneira esse pai lhe representa. Por outro lado, o que será de um pai cristão que não é capaz de exercer governo sobre a sua casa? Deus reservará os seus segredos a outro.

Há um compromisso sério com Deus ao ser pai, e também em ser avô. Há vários mandamentos em relação aos avós. Não é só desfrutar do crescimento dos netos; mas, fundamentalmente deixar um rastro de fé na vida dos pequeninos. Ainda recordo do meu avô pastor, sua vida, caráter e ensinos, as que –depois que cresci– não foram esquecidos.

Avós, falem com seus netos do Senhor, ensine-os a orar, contatem-nos com a Vida. Há um compromisso da parte do Senhor. Até que Ele venha, temos tal responsabilidade.

A diligência de Jó

No mesmo tempo de Abraão, está Jó, «homem íntegro e reto, que temia a Deus e se desviava do mal. Nasceram-lhe sete filhos e três filhas.». Há um exemplo aqui. «Iam seus filhos à casa uns dos outros e faziam banquetes cada um por sua vez; e mandavam convidar as suas três irmãs para comerem e beberem com eles. E sucedia que, tendo decorrido o turno de dias de seus banquetes, enviava Jó e os santificava; e, levantando-se de madrugada, oferecia holocaustos segundo o número de todos eles; pois dizia Jó: Talvez meus filhos tenham pecado, e blasfemado de Deus no seu coração. Assim o fazia Jó continuamente.» (Jó 1:4-5).

Os filhos de Jó tinham contínuos encontros sociais, festas nos quais possivelmente pecavam. Isso não passava inadvertido para Jó. Pelo contrário, diligentemente, ele lhes chamava para santificar-se para não ofender a Deus. Esta diligencia por manter a santidade na vida de seus filhos é outro exemplo para destacar. Um pai não pode descuidar da conduta de seus filhos. A nossa responsabilidade em ensinar o correto continua ainda além da juventude. Jó se preocupava em saber que seus filhos andassem mal com Deus, por isso exercia seu poder e autoridade, lhes chamando uma e outra vez para aproximar seus corações de Deus.

Penso que em uma reunião familiar, onde o pai se reúne com toda a família e lhes faz recordar as bondades do Senhor, cativando os corações deles para o Senhor. Aconselho a todo pai de família ter de contínuo um tempo de encontro com seus filhos para falar do Senhor e agradecer os seus favores.

Por outro lado, o exemplo de Jó nos ensina que o exercício da autoridade sobre um filho pressupõe uma vida comprometida. Não há coisa mais violenta na vida espiritual de um filho que um pai religioso; quero dizer, que suas palavras não tenham sustento em seus atos. Quantos filhos perderam a força e a fé por causa da inconsequência dos seus pais? O Senhor tenha misericórdia daquele que danificou a consciência de seus filhos por seu mau comportamento. Graças a Deus, sempre haverá outra oportunidade para aquele que se arrepende e concerta o seu erro. De modo que não há desculpa para exercer a paternidade responsável segundo o Senhor.

Também é certo que há variáveis que não dependem dos pais: filhos voluntariosos, teimosos, difíceis de tratar, que se apartaram da fé. Não obstante, a paternidade não terminou. O exemplo de Jó nos estimula a chamar com esperança, com cordas de amor, com paixão, a aquele que se extraviou. Chegará o dia em que a Palavra dará o seu fruto.

A santificação de Jacó

Agora vejamos o caso de Jacó. «Depois disse Deus a Jacó: Levanta-te, sobe a Betel e habita ali; e faze ali um altar ao Deus que te apareceu quando fugias da face de Esaú, teu irmão. Então disse Jacó à sua família, e a todos os que com ele estavam: Lançai fora os deuses estranhos que há no meio de vós, e purificai-vos e mudai as vossas vestes. Levantemo-nos, e subamos a Betel; ali farei um altar ao Deus que me respondeu no dia da minha angústia, e que foi comigo no caminho por onde andei.» (Gên. 35:1-3).

Notem que interessante é a conduta de Jacó. Deus lhe chama e ele diz: «Isto não é só para mim, mas para toda a minha família». Ele não duvidou em nenhum momento que a santificação era para toda a sua casa, e chamou a todos os seus a santificar-se, convenceu-os e partiu com todos ao chamado para a casa de Deus.

O individualismo de hoje não vai com o evangelho. «Coisificar» a Deus como se fosse um talismã privado no bolso representa uma atitude herege e egoísta. Viver a fé em forma privada nos desvincula de outros. A vontade de Deus é a nossa santificação, e tem que haver com todos os que nos rodeiam – sua esposa, seu marido, seus filhos, suas noras, seus genros, com tudo o que tem.

O desafio de Moisés

«Pelo que Moisés e Arão foram levados outra vez a Faraó, e ele lhes disse: Ide, servi ao Senhor vosso Deus. Mas quais são os que hão de ir? Respondeu-lhe Moisés: Havemos de ir com os nossos jovens e com os nossos velhos; com os nossos filhos e com as nossas filhas, com os nossos rebanhos e com o nosso gado havemos de ir; porque temos de celebrar uma festa ao Senhor. Replicou-lhes Faraó: Seja o Senhor convosco, se eu vos deixar ir a vós e a vossos pequeninos! Olhai, porque há mal diante de vós. Não será assim; agora, ide vós, os homens, e servi ao Senhor…» (Êx. 10:8-11).

Moisés se enfrenta com Faraó. Solicita-lhe a autorização para sair do Egito para celebrar em sua terra a festa solene ao Senhor. Mas vemos na resposta de Faraó uma preocupação ardilosa e encoberta com um especial interesse nas crianças. Se observarmos com atenção todo o capítulo observaremos a sinistra intenção de separar os filhos da família, pondo como pretexto a segurança deles. «Seja o Senhor convosco, se eu vos deixar ir a vós e a vossos pequeninos! Olhai, porque há mal diante de vós. Não será assim; agora, ide vós, os homens, e servi ao Senhor...».

Assim é o mundo. Diz-nos: «Eu entretenho a seus filhos enquanto vocês assistem as suas festas solenes». Assim é também o mundo religioso, que diz: «Deixemos os meninos encarregados com alguém, para assim nós participarmos com tranquilidade daquele retiro».

Há um tempo atrás, recebi um moço com um coração cheio de raiva. A sua aparência física cabisbaixa, delatava-lhe. Vestia-se inteiramente de preto; sua atitude era um tanto agressiva; seu falar, seus gestos, denotavam dor e frustração. Dizia-me: «Quando menino, eu fui cristão. Mas meus pais iam sempre a retiros de casais e me deixavam na casa de um vizinho; e o vizinho abusou de mim desde que eu tinha seis anos até os doze anos, enquanto eles se dedicavam a sua religião». Percebe quão difícil é falar do evangelho para esse moço? Felizmente, hoje avançamos com ele na comunhão e no perdão.

Em minha experiência como família, junto a minha esposa, decidimos ter vários filhos, e também decidimos não nos separar nunca deles. Pensamos que, já que os tivemos, devemos ir para todos lados com eles, mesmo com desconforto de outros, especialmente nas reuniões da igreja. Um bebê é parte da família de Deus, e se chorar, é sua forma de se expressar. Onde há meninos há vida e haverá também barulho. Devemos nos acostumar a tolerar o ruído. Quando alguém se torna mais velho, parece que se esquecesse que já foi menino, ou que seus filhos já fizeram ruído um dia. Aos meninos temos que educá-los, não excluí-los.

Onde estão os nossos filhos? Quando organizamos alguma atividade para eles, não é porque incomodam, mas porque temos que aplicar a palavra do Senhor em suas mentes infantis. E as irmãs se preparam para isso, não para entretê-los, mas para educá-los. Os meninos não incomodam na igreja; eles são a igreja. O Senhor nos encha de muitos meninos, porque isso significa que a igreja tem futuro e será gloriosa. O Senhor nos ajude, dê-nos paciência e sabedoria. Não deixaremos nenhum filho no Egito!

A determinação de Josué

Por último vejamos o exemplo de Josué. «...certamente nenhum de vós entrará na terra a respeito da qual jurei que vos faria habitar nela, salvo Calebe, filho de Jefoné, e Josué, filho de Num. Mas aos vossos pequeninos, dos quais dissestes que seriam por presa, a estes introduzirei na terra, e eles conhecerão a terra que vós rejeitastes.» (Núm. 14. 30-31).

Vejam o interesse que o Senhor tem com as crianças. Ele introduziu a todos os meninos na Terra Prometida; em troca, deixou fora a todos os adultos incrédulos, salvo a Josué e a Calebe, porque estes dois –diz a Escritura– tinham um espírito diferente. Eles tinham caráter, convicção, fé e coragem. Um jovem recobra ânimo ao ver seus entes mais velhos com tal força.

Josué conduziu ao povo para a Terra Prometida, e depois de lhes dar repouso, reuniu a todo Israel e lhes recordou uma vez mais as proezas do Senhor com o seu povo. Diante de uma multidão de israelitas, discursou para eles com força à fidelidade com estas memoráveis palavras: «Mas, se vos parece mal o servirdes ao Senhor, escolhei hoje a quem haveis de servir; se aos deuses a quem serviram vossos pais, que estavam além do Rio, ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais. Porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor. » (Josué 24:15).

Deus nos fala nestes exemplos. Nestes dias, mais do que nunca é imperioso estarmos equipados com um caráter determinante, convincente, cheios de fé e coragem, para passar a Palavra aos nossos filhos. No exemplo de Noé, Deus nos diz: «Entra tu e toda a tua casa», e nós respondemos com o exemplo de Josué: «Eu e a minha casa serviremos ao Senhor».

Proclamemos hoje: «Eu e a minha casa serviremos ao Senhor». Declaremos como família esta Palavra, com compromisso diante do Pai: «Eu e minha casa serviremos ao Senhor!».

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