ÁGUAS VIVAS
Para a proclamação do Evangelho e a edificação do Corpo de Cristo
Cristo em Colossenses
Nove aspectos da glória de Cristo.
Roberto Sáez
«Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda criação. Porque nele foram criadas todas as coisas, as que estão nos céus e as que estão na terra, visíveis e invisíveis; sejam tronos, sejam domínios, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por meio dele e para ele. E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas nele subsistem; e ele é a cabeça do corpo que é a igreja, o que é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência» (Col.1:15-18).
As palavras destacadas em negrito nos mostram, com toda a clareza, a glória de Cristo nesta epístola aos Colossenses; a elas terei que acrescentar as seguintes: «Cristo em vós, a esperança da glória» (1:27), e «Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade» (2:9).
1. Cristo como a imagem de Deus
A glória de Cristo é nos ter trazido a imagem do Deus invisível. Deus é espírito, e como tal, não tem uma imagem visível. Deus nunca tinha sido visto por ninguém, pois tal coisa era impossível. No Antigo Testamento se fala de Deus de maneira antropomórfica, ao fazer referências ao dedo de Deus, o rosto de Deus, a mão de Deus, de forma simbólica.
Mas Deus se fez visível a nós em Cristo; por isso João nos faz lembrar das palavras que Jesus disse de si mesmo: «quem vê a mim, vê aquele que me enviou», ou também como João nos descreve a forma como Cristo mostrou a Deus quando diz: «Ninguém jamais viu a Deus; o unigênito Filho, que está no seio do Pai, este o deu a conhecer» (Jo. 1:18); parafraseando este texto diria: «A Deus ninguém jamais o exegetou; o unigênito Filho, que está no seio do Pai, lhe tem exegetado».
A palavra exegese passou do grego para o espanhol (ou português) da mesma forma, e esta é a palavra que João usa para nos explicar como é que Cristo interpretou a Deus. Cristo é o revelador de Deus, pois nele foi refletido fielmente como Deus é. Não apenas pelas palavras que Cristo disse dele, mas também por suas obras, sua conduta irrepreensível, sua morte e ressurreição.
O grandioso é que em Jesus Cristo como homem se manifestou visivelmente o poder de Deus, refletido nos sinais que Cristo fazia, na sabedoria e autoridade com que falava –jamais homem algum falou como ele– e no cumprimento do culto hebreu, com suas oferendas, sacrifícios, festas, sacerdócio, templo, profecias, shabat – tudo o que era sombra da realidade foi manifestada em Cristo.
No culto hebreu, Deus se revela a Israel através de símbolos, para ensinar ao povo como aproximar-se e como caminhar com ele, além de revelar seu caráter através da lei. Cristo é a realidade desses símbolos; nele se cumpre de maneira real a lei e tudo o que foi expresso no culto hebreu; Cristo é a própria expressão da lei de Deus.
A cruz é a obra central de Cristo, onde revela a glória de Deus, ao satisfazer a justiça divina conjugando-a com o amor de Deus pelos pecadores. Justiça e amor se encontraram, reuniram-se e se manifestaram como os extremos do caráter de Deus revelado na cruz de Cristo. Para que Deus fosse compreendido em sua justiça, tinha que condenar e castigar o pecado; a humanidade representada em Cristo foi levada para a cruz. Quando Cristo morreu, para Deus, o mundo inteiro foi levado a juízo. Toda a raça de Adão foi posta na cruz; Jesus morreu uma morte vicária. Esse foi o justo juízo de Deus a uma humanidade perdida.
Mas a sabedoria de Deus é revelada em Cristo crucificado, pois Deus está fazendo uma transação da justiça divina; ele está transferindo o castigo que a humanidade merecia para Cristo crucificado, ao mesmo tempo que pela justiça de Cristo –o qual foi inocente de toda culpa– transfere a justiça a todo aquele que crê no Filho de Deus, a todo aquele que recebe a abundância da graça e o dom da justiça de Deus. Na cruz de Cristo é revelado o poder, as riquezas, a sabedoria, a fortaleza, a honra, a glória, e o louvor de Deus. Sete virtudes, das quais são ditas em Apocalipse, que o Cordeiro imolado é digno de tomar. Ou seja, que a glória de Deus, é a glória do Cordeiro. Por tudo isto e muito mais, Cristo é a imagem do Deus invisível.
2. Cristo, o primogênito de toda criação.
A palavra «primogênito» tem dois sentidos: o primeiro é usado para designar o que vai em primeiro lugar, e o outro para destacar ao primeiro que nasceu. Paulo está referindo-se a Jesus nesta ocasião, como o primeiro da criação, dando a entender que Cristo é a causa pela qual foram feitas todas as coisas –«porque nele foram criadas todas as coisas»– e esta expressão exclui a ele, sendo ele mesmo o autor de toda criação.
As preposições «de», «por» e «para» são indicadores da origem, sustento e fim de todas as coisas. A preposição «de» indica a procedência das coisas; a preposição «por» refere como são sustentadas as coisas e a preposição «para» destaca o objetivo com que foram feitas as coisas. Encontramos estas preposições ao longo de todas as Sagradas Escrituras referidas ao Pai, outras vezes ao Filho e outras vezes ao Espírito, indicando que é Deus –o Deus trino– em quem se originam todas as coisas, deste modo nele se sustentam e encontram o seu objetivo final. «Porque dele, por ele, e para ele, são todas as coisas» (Rom. 11:36). Esta frase que faz referência à glória de Deus, em Colossenses se refere à glória de Cristo, o qual comprova a afirmação quanto ao uso destas preposições em toda a Bíblia referidas ao Deus trino.
3. Cristo é antes de todas as coisas
Esta afirmação confirma mais ainda a glória de Cristo quanto a sua eternidade, pois «ele é antes de todas as coisas» ficando excluído das coisas criadas, sendo coparticipante, junto ao Pai e ao Espírito Santo na autoria de todas as coisas que foram criadas. Este é o verdadeiro sentido da atribuição a Cristo como o primogênito de toda criação.
4. Em Cristo subsistem todas as coisas
A preposição «por» é referida a Cristo com maior frequência em toda a Bíblia, pois no antecipado e determinado conselho de Deus, a convergência de todas as coisas que estão nos céus e na terra foram atribuídas à pessoa de Cristo. Dito de outro modo, a reunião de todas as coisas debaixo de Cristo como o cabeça de todo o universo, foi uma determinação tomada antes de todas as coisas. Tudo se resume em Cristo, tudo converge nele, devido à gestão redentora na cruz do Calvário, onde a autoridade do reino de Deus ficou reivindicada da rebelião dos anjos caídos e a do homem lá no jardim do Éden; por isso Deus lhe deu glória exaltando-o ao máximo, constituindo-o herdeiro do universo. Sendo Cristo o eixo central onde converge toda a criação de Deus, não pode ser mais glorioso do que já é.
Sem a mediação de Cristo na cruz, o Espírito Santo não poderia ter descido dos céus para a terra para conduzir aos remidos à glória; o Pai não haveria completado o seu eterno propósito de compartilhar a sua vida, reino e glória através de Cristo com a sua criação; por isso a sustentação de todas as coisas descansa na mediação de Jesus Cristo.
5. Cristo a cabeça do corpo que é a igreja
Cristo participa da criação. Como homem, é nascido de mulher, passa por todas as contingências da natureza humana: é gerado pelo Espírito, nasce como nascem todos os bebês, cresce em toda sabedoria, estatura e graça para com Deus e os homens, trabalha para o sustento de sua família, vemo-lo sofrer, chorar, comer, cansar-se… quer dizer, assume tudo o que o ser humano é, exceto o pecado, pois nele não se achou maldade nem engano.
Tudo o que foi dito no parágrafo anterior, é para exaltar a obra mestra da criação, a qual Deus sempre quis ter que é o homem. A encarnação do Verbo de Deus não se deve apenas ao pecado, e, portanto, tampouco corresponde somente à redenção; do contrário, Deus teria ficado sujeito a um corpo humano por toda a eternidade, unicamente por causa do pecado do homem. O primeiro homem foi criado tendo presente a imagem daquele que haveria de vir, o qual é Cristo; e a criação desse homem é anterior ao pecado. Deus não criou ao homem para que caísse, criou-o para que fosse um reflexo da sua imagem, imagem que estava concebida desde a eternidade; por isso Deus sempre soube que ele seria manifestado em carne.
A forma de assumi-lo teria sido diferente ao que vimos na redenção, mas igualmente teria se encarnado, pois a sua vontade era essa desde a eternidade. Essa forma diferente teria sido através de uma comida verdadeira e correta. Era por comer a Cristo, a árvore da vida, que o homem teria incorporado a imagem de Deus, e essa árvore deixaria de ser um mistério para revelar-se por completo na incorporação da imagem do homem. A redenção não é um fim, mas o meio pelo qual Deus continua com o seu eterno propósito de revelar-se divina e humanamente em Cristo. Cristo teria obtido a igreja sem a redenção, se o homem do princípio tivesse comido do seu fruto. A igreja veio através da redenção, não como um plano de último minuto, mas sim porque ter uma família conformada a sua imagem era o desejo de Deus desde a eternidade: a criação de uma família com quem compartilhar o seu reino, sua vida e glória.
Agora sabemos que esse homem que Deus sempre quis ter, é Cristo e sua igreja, sendo Cristo a cabeça e a igreja o seu corpo. Foi por uma comida equivocada que veio a desgraça de perder a imagem de Deus; foi por uma comida verdadeira que veio a restauração da imagem de Deus; disto dá sinais a Santa Ceia, onde os cristãos manifestam, como corpo de Cristo, a nossa união com ele, sendo Cristo a cabeça do corpo que é a igreja.
6. Cristo como o primogênito dentre os mortos
Isto significa que Cristo é o primeiro a ressuscitar para não voltar a morrer nunca mais. A festa das primícias, em Israel, comemorava a ceifa dos primeiros frutos da terra. Celebra-se o fato de que o grão de trigo, depois de ter caído na terra e haver rompida a sua casca deixa liberada a vida do seu interior, para dar como fruto a multiplicação de muitos grãos. Jesus usou esta metáfora para referir-se a sua morte e ressurreição. A morte de Cristo é uma morte fecunda e frutífera, pois da mesma maneira como o grão partido clandestinamente dá lugar à vida, da mesma forma é Cristo, pois com a sua morte, liberou a vida da ressurreição repartindo-a aos seus redimidos. Nós celebramos uma contínua festa das primícias, esperando aquele dia glorioso em que os mortos em Cristo serão levantados e os que vivem serão transformados.
7. Cristo preeminente
Esta frase referida a Cristo demonstra uma vez mais nesta exposição, a supremacia e centralidade de Cristo no pináculo do universo da criação de Deus, assinalando a glória de Cristo, nas coisas criadas, sejam estas visíveis ou invisíveis, sejam tronos, domínios, potestades, principados – tudo converge nele. Isto não significa que Deus ficou sem glória por havê-la dado a Cristo, pois o Pai foi glorificado pelo Filho e o Filho pelo Pai no Espírito Santo.
8. Em Cristo habitou a plenitude de Deus
Esta expressão mostra que na encarnação Cristo não está sozinho, embora dos três, é o Filho quem foi encarnado; mas eles o acompanham em comunhão de vida e propósito, o Pai e o Espírito Santo. No entanto, Cristo encarnado recusa a forma de Deus como coisa a que aferrar-se, e se despoja de si mesmo, quer dizer, que na encarnação, sem deixar de ser Deus, prefere aniquilar-se (fazer-se nada) para manifestar na forma humana a plenitude de Deus.
Nunca se deve confundir as pessoas da Trindade, nem separar a substância de Deus, pois o que vemos no Pai, vemo-lo no Filho e no Espírito Santo da mesma forma. O Pai, o Filho e o Espírito Santo, sendo um conjunto, uma família, compartilham uma igualdade de substância vivendo em perfeita unidade. Por esta razão, Cristo, nos dias da sua carne, nunca viveu separado do Pai, manifestando essa unidade pelo Espírito em todo momento e ação.
9. Cristo em vós a esperança de glória
A glória de Deus é um dos aspectos da imagem de Deus, quando o pecado não existia, a criação de Deus contemplava e refletia a glória de Deus. O homem foi criado com o mesmo propósito. Isto é o que nos diz Paulo no capítulo 1:3-14 de Efésios, que o Pai nos escolheu para o louvor da sua glória, que o Filho nos redimiu para o louvor da sua glória e que o Espírito Santo nos selou para o louvor da glória de Deus.
Na queda, nos tornamos trevas; a separação de Deus nos separou da sua glória. No jardim, o homem conversava com Deus face a face; quando pecou, escondeu-se, assumiu a consciência da sua nudez, perdeu a cobertura de Deus; o vestido que Deus lhe tinha posto era o da glória de Deus; ao cair em pecado, perdeu a glória de Deus.
Ao tentar recuperar a cobertura (o vestido), tece um avental de folhas de figueira. Isto não agradou a Deus, pois recuperar a glória será um longo caminho através da cruz. Deus lhe dá a primeira lição de redenção ao sacrificar um cordeiro e vestir a nudez deles com a pele de um animal inocente. A inocência do cordeiro é transferida ao pecador e a culpa do pecador é transferida ao cordeiro inocente. É uma ação do Deus que salva e não do que o homem pode fazer.
O tema da cobertura de Deus é encontrada extensamente difundido em toda a Bíblia. A desgraça maior do ser humano é ficar descoberto da glória de Deus e a glória maior é morar debaixo da sua coberta.
A redenção nos põe no caminho de volta à glória, em um olhar contínuo com o rosto descoberto a glória do Senhor. Mediante essa contemplação de sua glória, é que somos transformados em sua própria imagem pelo Espírito Santo de Deus. A justificação é o início, e a santificação, através da cruz carregada dia a dia, é o caminho de volta à glória. Sem cruz não há glória; amar a glória dos homens é desprezar a glória de Deus.
Muitas vezes tomar a cruz significará perder a glória humana. Precisamos aprender que sem cruz não haverá glória; por isso precisamos valorizar a cruz, ao ponto de nos gloriarmos na cruz de Cristo. Toda glória que não passa pela cruz, é completamente vã e não tem outro fim que extinguir-se nas trevas. É Cristo em nós a esperança de glória; é sua vida partilhada em nosso espírito é a que nos leva de glória em glória, mesmo que para isso nos faça passar pelo fogo e pela água; não obstante, o fogo não nos queimará e a água não nos submergirá.