ÁGUAS VIVAS
Para a proclamação do Evangelho e a edificação do Corpo de Cristo
Seus juízos são verdadeiros e justos
Rubén Chacón
«Porque os seus juízos são verdadeiros e justos» (Apoc. 19:2).
Os juízos de Deus são realmente justos e verdadeiros? Apesar da sua crueldade e muitas vezes sangrentos, seguem sendo verdadeiros e justos? E embora a ordem de Deus seja: «Vai e ataca aos amalequitas… Destrói por completo tudo o que lhes pertença; não tenha compaixão. Mata-os a todos, homens e mulheres, meninos e recém-nascidos, touros e ovelhas, camelos e asnos» (1ª Samuel 15:3 NVI) os castigos de Deus seguem sendo justos e verdadeiros? Se forem como podemos entender a verdade e a justiça deles? Que verdade se esconde por trás dos juízos de Deus que os faz justos?
Quando a maldade chega ao ápice
Uma primeira verdade que explica que os juízos de Deus são verdadeiros e justos é aquela que mostra que os juízos de Deus só descem uma vez que a maldade dos homens chega ao seu ápice. O nosso Deus não atua debaixo de «arrebates de ira», como nós muitas vezes. Deus é «tardio em irar-se e grande em misericórdia». Assim foi revelado a Moisés o caráter de Deus quando viu as suas costas (Êx. 34:6). Os juízos de Deus se fazem sentir uma vez que a iniquidade dos homens extrapola; quando já não há possibilidade de retorno da maldade.
Um primeiro exemplo temos no caso dos amorreus. Abraão já se encontrava em Canaã e, no entanto, Deus lhe revela que a sua descendência não morará mais na terra prometida, mas em terra alheia (Egito), onde será escrava e será oprimida por quatrocentos anos. Que razão poderosa existe para que Deus faça dar uma volta tão longa aos filhos de Abraão? Por que não tomar posse de Canaã imediatamente? Por que teriam que voltar para Canaã, na recente quarta geração? Esta é a divina resposta: «Porque ainda não chegou ao seu cúmulo a maldade do amorreu até aqui» (Gên. 15:16). Ou como diz a NVI: «Porque antes disso não terá chegado ao cúmulo a iniquidade dos amorreus». Quer dizer que Deus não executará os seus juízos contra eles, a menos que a maldade dos amorreus tenha ultrapassado todo cálculo. Por quê? Porque os juízos de Deus são verdadeiros e justos.
O nosso Deus é tardio em irar-se e grande em misericórdia. O Senhor é primeiro cheio de amor e misericórdia. A sua paciência pode esperar quatrocentos anos, porque ele não procura nem quer a perdição dos homens. A sua ira se manifesta somente quando todos os recursos salvadores de Deus se esgotam. Agora, talvez, podemos entender um pouco por que, quando desce a sua ira, não tem misericórdia de ninguém.
Sodoma e Gomorra
Um segundo exemplo temos em Sodoma e Gomorra. Novamente temos a Deus falando com Abraão. Deus pergunta a si mesmo: «Encobrirei eu a Abraão o que vou fazer». O que o Senhor estava pensando em fazer? Destruir as cidades de Sodoma e Gomorra. Então, dá a conhecer os seus planos ao seu amigo Abraão, nos seguintes termos: «Porquanto o clamor contra Sodoma e Gomorra aumenta mais e mais, e o pecado deles se agravou em extremo» (Gên. 18:20).
«Agravar-se em extremo» é uma expressão equivalente a «chegar ao cúmulo». Quando um doente se agrava em extremo, o inexorável passo seguinte é a morte. Desta mesma forma aconteceu com Sodoma e Gomorra, não sem antes o Senhor libertar «ao justo Ló, que se achava afligido pela vida desenfreada desses perversos, pois este justo, que convivia com eles e amava o bem, dia após dia sentia que lhe despedaçava a alma pelas obras iníquas que via e ouvia». Tudo isto demonstra, diz o apóstolo Pedro, «que o Senhor sabe livrar da provação aos que vivem como Deus quer, e reservar os ímpios para castigá-los no dia do juízo» (2ª Pedro 2:7-9 NVI).
Os judeus
Um terceiro exemplo, achamos no Novo Testamento com o caso dos judeus. O apóstolo Paulo, escrevendo aos tessalonicenses em sua primeira carta, e referindo-se aos judeus, lhes diz: «Pois procuram impedir que preguemos aos gentios para que sejam salvos. Assim em tudo o que fazem chegam ao cúmulo do seu pecado. Mas o castigo de Deus virá sobre eles com toda severidade» (2:16 NVI).
Os judeus, não contentes em ter matado ao Senhor Jesus e os seus próprios profetas, além disso expulsaram aos apóstolos do nosso Senhor Jesus Cristo. Mas o cúmulo dos cúmulos, segundo Paulo, é que os impediam de falar aos gentios para que estes fossem salvos. Assim enchem a medida dos seus pecados. Que tremendo é pensar que se os judeus tivessem crido na mensagem dos apóstolos, teriam encontrado salvação apesar de ter matado ao Senhor Jesus. Tudo o que tinham que fazer era crer e arrepender-se. No entanto, não só não o fizeram, como também perseguiram as igrejas judaicas e impediam que os apóstolos pregassem aos não judeus.
Apenas vinte anos depois que Paulo fez esta denuncia no ano 70 D.C., o juízo de Deus desceu sobre eles. Os exércitos romanos a mando do general Tito, destruíram a cidade de Jerusalém. Segundo Josef, historiador da época, os mortos durante o cerco à cidade subiram para um milhão e cem mil, e os cativos em toda esta guerra, a noventa e sete mil judeus. A grande quantidade de habitantes de Jerusalém se explica porque os judeus tinham subido de todas as partes para celebrar a festa da Páscoa. Que paradoxo! Celebravam a páscoa, mas tinham rejeitado ao Cordeiro de Deus. E por quase dois mil anos os judeus perderam a sua terra, desapareceram como nação e foram dispersos por todo mundo. Lá foram odiados e perseguidos. Até de provérbio e zombaria foram objetos (Deut. 28:37). Uma vez mais o princípio divino se manteve. O juízo de Deus veio uma vez que o pecado dos judeus completou a sua medida. Os juízos do Senhor são verdadeiros e justos.
Esta geração
Um último exemplo será o que está logo por acontecer. Porque os juízos de Deus também descerão sobre esta geração. Esta será a última vez que os seus juízos irão visitar a terra. Mas esta vez não será como as outras vezes. Esta vez não descerá sobre um povo (o amorreu) ou uma cidade (Sodoma), mas sobre toda a terra.
Olhemos novamente para as palavras de Paulo, agora em sua segunda carta aos tessalonicenses: «E agora vós sabeis o que o detém, a fim de que ao seu devido tempo se manifeste. Porque já está em ação o mistério da iniquidade; somente há quem no presente o detém, até que ele de uma vez seja tirado do meio» (2:6-7). Paulo está profetizando aqui a vinda do homem que será a própria encarnação da iniquidade. Não obstante, diz que esse homem não pode manifestar-se ainda, porque algo ou alguém, no presente, tem freado a maldade.
Por que a maldade está freada? Porque hoje ainda vivemos o tempo da salvação. A maldade não chegou ao seu ápice, porque Deus a tem freado. Nosso Pai celestial ainda mantém as condições necessárias para que qualquer dos homens possa ser salvo. Ele não quer que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento. A sua paciência e o seu amor estiveram disponíveis para todos os homens por mais de dois mil anos.
No entanto, quando o dia da salvação terminar e o tempo aceitável culminar, e para que os juízos de Deus sejam justos e verdadeiros, Deus tirará o freio da iniquidade a fim de que a maldade se desenfreie sem nenhum impedimento e chegue então ao seu ápice. Uma vez mais a ira de Deus se fará sentir somente quando a maldade tiver chegado ao seu ápice. O fato prodigioso, entretanto, é que a iniquidade não chegará lá até que o dia da salvação tenha terminado. Que grande é o nosso Deus! Bendita é a sua graça e a sua misericórdia! Mas uma vez que aquele dia termine e Deus tiver tirado o freio da maldade, «então se manifestará aquele iníquo». «Iníquo cujo advento é por obra de Satanás, com grande poder e sinais e prodígios mentirosos» (vv. 8-9).
Qual será o objetivo deste filho do diabo, que Deus permitirá que se manifeste? «Com toda perversidade enganará aos que se perdem por haver-se negado a amar a verdade e assim serem salvos. Por isso Deus permite que, pelo poder do engano, creiam na mentira. Assim serão condenados todos os que não creram na verdade, mas se deleitaram no mal» (vv. 10-11 NVI). Quando a maldade se manifestar sem controle algum, todos os que não receberam o evangelho serão enganados e já ninguém poderá ser salvo. Far-se-ão assim dignos da ira de Deus, porque os seus juízos são verdadeiros e justos.
Por isso não é de estranhar o que lemos em Apocalipse, quando falando precisamente dos juízos de Deus que virão, diz: «O resto da humanidade, os que não morreram por causa destas pragas, tampouco se arrependeram das suas más ações nem deixaram de adorar aos demônios e aos ídolos de ouro, prata, bronze, pedra e madeira, os quais não podem ver nem ouvir nem caminhar. Tampouco se arrependeram dos seus assassinatos nem das suas artes mágicas, imoralidade sexual e roubos» (9:20-21 NVI). Ver também Ap. 16:9, 11, 21. Em outras circunstâncias, era de se esperar que os que sobreviveram às pragas se arrependessem. Mas não neste caso; agora já não há lugar para o arrependimento.
Para falar a verdade, os juízos de Deus não produzem salvação, mas condenação. Por isso, não é de estranhar tampouco que Faraó, em lugar de arrepender-se, endureceu-se uma e outra vez, quando as pragas divinas caíram sobre os egípcios. O amor de Deus, a sua paciência e a sua salvação, manifestaram-se sobre o Egito nos dias de José, filho de Jacó. Por cerca de oitenta anos, o Egito tinha sido objeto da visitação de Deus através de um dos «tipos» de Cristo mais perfeitos de toda a Bíblia. Mas esse tempo já tinha passado. Agora os juízos de Deus caíram com toda severidade e não produziram arrependimento algum.
Os que não conheceram a Deus em seu amor, o conhecerão em sua ira. Os que desprezaram a «taça» do novo pacto, beberão das taças da ira de Deus. Aqueles que não se cobriram no Filho, o qual sofreu a ira de Deus por nós, terão que enfrentá-la direta e pessoalmente. Mas estes, sabendo que é Deus quem faz sentir a sua ira, em lugar de arrepender-se, levantam-lhe o seu punho em franca, consciente e suicida rebelião, para que seja evidente a todos que os juízos de Deus são justos e verdadeiros.
Quando os homens rejeitam a Cristo
Uma segunda verdade que explica que os juízos de Deus são verdadeiros e justos é aquela que mostra que, tendo o homem a oportunidade de escapar deles, a rejeitam. É verdade que os pecados do homem manifestam a ira de Deus; no entanto, é certo que Deus tem provido uma forma de escapar dela. O homem rejeita a oportunidade de livrar-se dos juízos de Deus quando, na prática, rejeita ao Filho de Deus, o nosso Senhor Jesus Cristo.
As Escrituras indicam que ele foi objeto da ira de Deus por nós. Isaías anunciou: «Ele foi transpassado por nossas rebeliões, e moído por nossas iniquidades; sobre ele recaiu o castigo, preço da nossa paz» (53:5 NVI). Em seguida, o profeta acrescenta que foi Deus quem submeteu o Messias a tão grande sacrifício: «Mas o Senhor quis quebrantá-lo e fazê-lo sofrer» (V. 10). Por quê? Porque desta forma Jesus Cristo fez expiação ou propiciação por nossos pecados.
Por outro lado, o apóstolo Paulo, em sua carta aos romanos, estabelece que Deus está de tal maneira do nosso lado «que não poupou nem a seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós» (Rom. 8:32). E anteriormente havia dito que «Deus pôs como propiciatório» a Cristo Jesus (3:25). Também, em sua segunda epístola aos Coríntios, Paulo declara que «aquele que não cometeu pecado algum, Deus o fez pecado por nós, para que nele recebêssemos a justiça de Deus» (5:21 NVI).
O apóstolo Pedro acrescenta um dado interessante quanto ao sacrifício de Cristo. Ele diz que, embora Jesus Cristo estivesse «já destinado desde antes da fundação do mundo», não obstante, foi «manifestado nos últimos tempos» (1ª Pedro 1:20). Isto quer dizer que Deus exerceu a sua paciência por muito tempo antes de descarregar a sua ira sobre o seu próprio Filho. Com efeito, Paulo diz que «anteriormente, em sua paciência, Deus tinha passado por cima dos pecados» (Rom. 3:25). Esse «anteriormente» se refere a toda à época antiga testamentária. No entanto a que pecados se refere? Aos de todos os homens daquela época? Não, já vimos que Deus desceu a sua ira várias vezes no Antigo Testamento.
Os pecados passados que Deus passou por cima foram somente aqueles que foram «cobertos» pelos sacrifícios do Antigo Testamento. Nosso Deus, em virtude do sacrifício oferecido, o qual preanunciava o sacrifico de Cristo, adiava a sua ira temporalmente em sua paciência, até aquele dia em que a descarregaria sobre o seu Filho Jesus. Dessa maneira Deus fazia justiça naquela época e livrava assim os homens da sua ira.
Mas quando o nosso bendito Senhor foi crucificado na cruz do Calvário, sofreu o castigo de Deus por todos os nossos pecados. Ali, ele foi feito propiciação por nossos pecados; «e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo» (1ª João 2:2). Que grande salvação é a que o nosso Senhor obteve! Não obstante o que será daqueles que desprezam o sacrifício de Cristo? Que sorte os espera? O único destino que os espera é enfrentar eles mesmos a ira de Deus. Se na hora de provar a ira de Deus, Jesus Cristo tomou o nosso lugar, o que será então daqueles que o rejeitam?
Finalmente, a condenação não vem aos homens por seus pecados, mas por não crer no Filho de Deus. É verdade que os nossos pecados despertaram a ira santa de Deus, no entanto, também é verdade que Jesus Cristo a sofreu por nós. Portanto, a condenação dos homens se produz, em rigor, por causa de não crer no Salvador. «Porque Deus não enviou a seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele» (João 3:17). Mas infelizmente esta é a causa da condenação: «Que a luz veio ao mundo, mas a humanidade preferiu as trevas à luz» (João 3:19 NVI).
Reconciliando o amor com a justiça
Diante disso, por que um Deus de amor requer necessariamente que a sua ira seja satisfeita? Por que em sua grande misericórdia não era suficiente que tomasse uma atitude tolerante para com os nossos pecados, ou simples e sinceramente se tornar alheio totalmente a eles? Porque neste assunto três coisas confluem ao mesmo tempo: O seu amor, o pecado e a sua justiça. O seu amor procura nos salvar, mas a sua justiça lhe impede de fazê-lo ilegalmente. Deus é amor, mas também é justo. É o seu amor que Deus procura satisfazer, não a sua ira; não obstante, é a sua justiça que exige que o pecado seja castigado, porque o pagamento do pecado é a morte.
Por esta razão podemos dizer que Deus tinha um grande conflito em si mesmo: Como conciliar o seu amor e a sua justiça? Deus é amor e justiça, e ele não pode negar-se a si mesmo; ele não pode ir contra a sua natureza. Deus em seu grande amor desejava nos resgatar, mas a sua justiça não lhe permitia passar por cima do pecado. Ele não é como nós. Quando os homens, por exemplo, indultam a um pecador, fazem um grande ato de amor e misericórdia. No entanto, é um ato extremamente injusto para a vítima e para os seus familiares. E mesmo que, o perdão viesse da própria vítima ou dos seus familiares, ainda existiria injustiça no ato, porque o delito continuaria impune.
Um perdão, para que por sua vez seja justo, deve necessariamente encarregar-se do delito. Ainda mais, em um caso hipotético, se um terceiro se oferecesse para pagar com a sua vida para salvar ao vitimario, ainda seria injusto, porque o justiçado não é responsável por esse pecado. Neste caso se cometeria uma injustiça com esta terceira pessoa.
O perdão do Senhor, ao contrário, não é injusto, porque está baseado precisamente na satisfação de sua justiça divina. Como Deus fez então? O ofendido pagou o preço. O próprio afetado veio e se submeteu ao castigo por nós. Como diz o irmão Nee: «Quando o pecado entrou no mundo, o governo de Deus foi prejudicado. A ordem que ele estabeleceu no universo foi transtornado; a sua glória foi pisoteada; a sua santidade foi profanada; a sua autoridade foi rejeitada; e a sua verdade foi mal entendida… Por ser justo, ele tinha que julgar o pecado. Mas, devido a ele ser amor, teve que se encarregar com os pecados do homem». Assim Deus foi justo e, ao mesmo tempo, aquele que justifica ao que crê em Jesus (Rom. 3:26). A sua severidade e a sua bondade ficaram assim reconciliadas e satisfeitas.
Por esta razão não é surpreendente que o apóstolo João diga em sua primeira carta que «se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para perdoar os nossos pecados» (1:9). Quando confessamos os nossos pecados, o perdão do Senhor não é apenas um ato de amor e de misericórdia; é também um ato de justiça. Por quê? Porque se Cristo já pagou por nossos pecados na cruz do Calvário, Deus estaria desconhecendo o sacrifício de seu Filho se não nos perdoasse. O nosso Pai estaria com isso cometendo uma injustiça contra o seu próprio Filho. Embora pareça incrível, é justo que Deus nos perdoe se confessarmos os nossos pecados, porque o seu perdão está apoiado em sua justiça que foi satisfeita na cruz de Cristo. Hoje, graças ao Senhor, a graça reina; no entanto, ela reina mediante a justiça. O seu perdão não é uma bagatela; teve ao contrário, um alto preço. Amém.